Carta Conforto não isenta o transportador do seguro obrigatório (Destaque)
Aparecido Rocha – insurance reviewer
A Lei 14.599 (Lei do Transporte Rodoviário de Cargas), publicada no Diário Oficial em 20.06.2023, estabelece a obrigatoriedade do transportador rodoviário contratar o Seguro de Responsabilidade Civil do Transportador Rodoviário de Cargas (RCTR-C), que cobre as perdas ou danos causados à carga transportada em acidentes, como colisão, abalroamento, tombamento, capotagem, incêndio ou explosão. Além disso, é exigido também o Seguro de Responsabilidade Civil do Transportador Rodoviário por Desaparecimento de Carga (RC-DC), que cobre roubos, furtos simples ou qualificados, apropriação indébita, estelionato, extorsão simples ou sequestro que ocorram durante o transporte da carga.
Antes da Lei 14.599, era comum que a seguradora do embarcador fornecesse ao transportador uma Carta de Dispensa do Direito de Regresso (DDR), indicando que a seguradora renunciava ao direito de mover uma ação regressiva contra o transportador por perdas ou danos causados às mercadorias do segurado. Com essa prática, o transportador não era obrigado a informar em sua apólice de responsabilidade civil facultativa por desvio de carga (RCF-DC) os transportes abrangidos pela DDR, e assim não cobrava o advalorem referente ao risco de roubo e outros eventos não cobertos pelo seguro de RCTR-C de seus clientes.
Com o advento da Lei 14.599, as seguradoras dos embarcadores passaram a fornecer um documento denominado “Carta Conforto”, que tem a mesma finalidade da DDR, ou seja, a seguradora indica que renuncia ao direito de ação direta ou via de regresso contra o transportador, por perdas ou danos causados às mercadorias do segurado, exclusivamente durante o trânsito terrestre dentro do território nacional, decorrentes de sinistros cobertos e indenizados pela apólice contratada pelo embarcador.
Entretanto, é importante notar que na carta conforto, a seguradora menciona que a referida carta não isenta o transportador destinatário de contratar os seguros obrigatórios de acordo com a legislação em vigor. Portanto, mesmo com a carta conforto, o transportador é obrigado a averbar todos os embarques das mercadorias em suas apólices de RCTR-C e RC-DC, uma vez que ambos os seguros são obrigatórios.
Recentemente, a Superintendência de Seguros Privados (Susep) colocou em consulta pública uma minuta de circular que estabelece as regras e critérios para a operação do seguro de transportes (Edital nº 5/2024/Susep) contratado pelas empresas embarcadoras de cargas em transporte nacional. Entre os temas propostos, está a questão da obrigatoriedade do seguro de transporte nacional. A Susep informou ainda que consultou a Procuradoria Federal e confirmou que a Lei 14.599/2023 não afastou, nem é contrária à norma que inclui o seguro de transporte como obrigatório (art. 20, alínea “h”, do Decreto Lei nº 73/1966). Nesse sentido, o art. 1º da minuta de circular colocada em consulta pública deixa claro que o seguro deve ser obrigatoriamente contratado.
Analisando o comportamento do mercado após a publicação da Lei 14.599, podemos observar uma confusão no entendimento de que o seguro de RC-DC sobrepõe o seguro de transporte nacional. Na verdade, são dois seguros distintos, com finalidades diferentes: o seguro de transporte nacional cobre fisicamente as cargas transportadas, enquanto o seguro de RC-DC cobre a responsabilidade civil do transportador. Portanto, é necessário que cada segurado (embarcador e transportador) negocie com sua própria seguradora, lembrando sempre da obrigatoriedade de averbação em ambos os seguros.
Na hipótese de o transportador entender que, com a carta conforto, ele não precisa averbar os embarques em sua apólice, estará cometendo uma infração sujeita a punições por descumprir as determinações da Lei 14.599.
Aparecido Rocha – insurance reviewer
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