Os Efeitos das Liminares no Seguro
Voltaire Marensi - Advogado e Professor
Em reportagem estampada na mídia, segunda-feira, ontem, dia 1º de julho, se trouxe à balha assunto envolvendo questão tributária em sede securitária. Segundo a sobredita reportagem, o ministro Luiz Fux, componente do Supremo Tribunal Federal, teria volta
do atrás em seu entendimento anterior, suspendendo a cobrança milionária de PIS e Cofins às seguradoras em relação à posição adotada inicialmente pela ministra aposentada Rosa Weber. [1]
Pois bem. A matéria é detalhada pela decisão do ministro que teria restabelecido uma liminar que suspendeu uma cobrança milionária de PIS e COFINS sobre as receitas financeiras das reservas técnicas de seguradoras. As beneficiadas, continua a matéria, foram a Mapfre Seguros Gerais S/A, a Companhia de Seguros Aliança do Brasil, a Aliança do Brasil Seguros S/A e a Mapfre Vida S/A. A decisão está lastreada na PET 9.607. O ministro ainda asseverou em sua decisão que teria proposto no RE 1.479.774, de sua relatoria, que a incidência de PIS/COFINS sobre as reservas técnicas das seguradoras seja objeto de análise com repercussão geral.
Enfim. Cuida-se de recurso extraordinário que tramita naquela Corte envolvendo o mesmo assunto.
No teor da matéria relatada pela repórter supra identificada, “as empresas informaram que já realizaram depósitos judiciais no valor de R$ 25,2 milhões para assegurar os débitos cobrados no processo. Além disso, informaram que a Aliança do Brasil Seguros foi autuada em R$ 5,5 milhões para exigência de PIS e COFINS. A Mapfre Seguros Gerais foi autuada para cobrança de R$ 48,1 milhões e a Brasil Veículos.” Sic da reportagem”.[2]
Nesta decisão o ministro Luiz Fux destacou que deixou de existir expectativa na decisão de mérito favorável às empresas que justificasse a liminar, uma vez que o STF decidiu, no Tema 372, que incide PIS/COFINS sobre as receitas de instituições financeiras. Agora, o ministro afirma que, após novo exame, concluiu que as discussões sobre o tema se arrimam em situações distintas.
Pois bem. A reserva técnica é o investimento obrigatório que seguradoras e resseguradoras devem manter como garantia de que podem arcar com eventuais pagamentos aos segurados.
Na prática, enfatiza a repórter, que no caso sub judice se trata de aplicações que geram receita financeira.
Como, de modo lúcido e escorreito, aduz Alexandre Del Fiori, há uma distinção de Provisão de excedentes técnicos e de excedentes financeiros.
O primeiro, segundo o especialista em nomenclatura securitária, “o título de provisão técnica deverá ser constituído para os valores destinados à distribuição de excedentes decorrentes de superávit técnico na operacionalização de seus contratos, caso haja sua previsão contratual”. De sua vez, “o título de provisão técnica deverá ser constituído para garantir os valores destinados à distribuição de excedentes financeiros, conforme regulamentação em vigor, caso haja sua previsão contratual”.[3]
De outro giro, se colhe na jurisprudência, que, em diversas decisões judiciais, os tribunais têm se manifestado sobre a não incidência de PIS e COFINS sobre as reservas técnicas. O entendimento majoritário é que as reservas técnicas não representam receita, mas sim obrigações futuras e, portanto, não devem ser incluídas na base de cálculo das contribuições.
Sob a ótica das seguradoras, a correta apuração e interpretação das normas relativas ao PIS e COFINS sobre reservas técnicas é crucial para evitar autuações fiscais e passivos tributários. A não inclusão das reservas técnicas na base de cálculo do PIS e da COFINS pode resultar em significativa economia tributária e melhor gestão financeira.
Ao reconsiderar sua decisão anterior, continua a reportagem que estribou o tema em foco, o ministro Luiz Fux afirmou que ao analisar o voto do ministro Dias Toffoli, relator do Tema 372, percebeu que o julgador afastou a aplicação do entendimento adotado no tema de repercussão geral às seguradoras. “O fato é que o ministro Dias Toffoli, redator do acórdão, afastou expressamente a aplicação do entendimento adotado naquele feito às empresas seguradoras, reconhecendo, implicitamente, que acerca destas últimas pode haver particularidades, ligadas ao delineamento de suas atividades típicas, que conduzam à solução diversa daquela adotada para as instituições financeiras típicas”.[4]
Consoante o julgador, “ainda que pendente de julgamento em sede de embargos de declaração no agravo no RE 400.479, o ministro Dias Toffoli “assentou sua compreensão de que a aplicação financeira dos recursos oriundos das reservas técnicas das empresas seguradoras não constitui atividade típica destas empresas, razão pela qual as receitas decorrentes destas aplicações não poderiam integrar a base de cálculo de PIS/COFINS.
Destarte, concluiu ainda que há controvérsia relevante acerca da natureza das receitas das seguradoras provenientes das aplicações financeiras de reservas técnicas. Por isso, segundo ele, propôs que no RE 1.479.774, de sua relatoria, o Plenário reconheça a repercussão geral da questão específica.
Diante desse cenário, o magistrado de última instância em sede constitucional, entendeu que há probabilidade do direito de as Companhias ser assegurado nesta linha de entendimento em prol de seus interesses. O ministro disse também que haveria periculum in mora, ou seja, perigo na demora, no caso de não suspensão da “execução de valores elevados, como são aqueles objetos do processo de origem, a recomendar a concessão de efeito suspensivo no presente caso concreto”.[5]
Deveras. O efeito suspensivo enquanto se examina a tese em sede de repercussão geral é um mecanismo processual importante para garantir a uniformidade e a segurança jurídica de elevada importância nas decisões judiciais em nossos tribunais.[6]
Em resumida síntese, o efeito suspensivo em sede de repercussão geral tem uma importância crucial no sistema jurídico implementado em nossa sistemática processual.
De outro giro, aproveito neste ensaio para transcrever o que escrevi algures, quando me referi a reservas matemáticas no contrato de seguro.
Eis, aí, algumas ponderações que fiz à época:
Em boa técnica securitária se costuma ressaltar que as reservas técnicas não são individualizadas, a não ser as matemáticas.
Neste diapasão, com perfeição técnica, o Código de Seguros Francês preceitua, verbis:
“Art. L. 132-18 (L nº81-5, 7 janv 1981; mod., L. nº 2001-1135, 3 déc. 2001).- Dans le cas de réticence ou fausse déclaration mentionné à l’ article L. 113-8, dans lê cãs où l’ assuré s’est donné volontairement la mort au cours du délai mentionné à l’ article L. 132-7 ou lorsque lê contrat exclut la garantie du décès em raison de la cause de celui-ci, l’ assureur verse au contractant, ou em cãs de décès de l” assuré, au bénéficiaire, une somme égale à la provision mathématique du contrat.”
( Code des Assurances, LexisNexis, Litex, 2008, Deuxiéme Édition,, pág. 263).
Já no direito italiano, o “Códice Delle Assicurazioni Private, (D. ls, 7 settembre 2005, n. 209), no “Capo II, artigo 36 prevê uma reserva técnica que compreende a reserva matemática, suficiente a garantir a obrigação assumida com a expectativa futura.
(Códice Delle Assicurazoni, 2007, Giuffrè Editore, Milano, pág. 76).
Ainda salientei:
Julgamento de uma hipótese de seguro de vida em grupo e não individual
De outra banda o Código Civil atual estabelece no artigo 801, que “o seguro de pessoas pode ser estipulado por pessoa natural ou jurídica em proveito de grupo que a ela, de qualquer modo, se vincule”.
Nos seguros de vida em grupo já previsto no ainda vigente Decreto-Lei número 73/66, o “estipulante é a pessoa que contrata seguro por conta de terceiros”, ou seja, é o seguro de vida em grupo, ex vi legis, da redação do artigo 21 do sobredito diploma legal.
Na prática se sabe que no seguro de vida em grupo não existe a formação de reserva matemática e de nenhuma outra individualizada, se constituindo essa devolução impraticável, embora a decisão em comento tenha dito que “a obrigação de restituir a reserva técnica ao beneficiário, não tenha conferido ao intérprete proceder uma interpretação restritiva”.
Tal colocação exarada na decisão que comentei alhures, de fato, está em consonância com o nosso diploma substantivo, de vez que o mencionado artigo 797 não fez esta distinção.
É aí que reafirmo faltar ao Brasil um Código de Seguros, aliás, já aprovado no Senado Federal que obedece a uma sistematização melhor elaborada e consolidada neste importante segmento de nossa economia”.[7]
É o que cabia informar aos nossos honrados e dignos leitores e leitoras, respectivamente, em complemento ao tema propriamente eleito como título desta matéria.
Porto Alegre, 02/07/2024
Voltaire Marensi - Advogado e Professor
[1] Site Jota. Por Mariana Branco. – Repórter especializada na cobertura tributária
[2] Ibidem.
[3] Dicionário de Seguros. Editora Lisbon Internacional Press, 1ª edição, 2022, páginas 430/431.
[4] Reportagem do site Jota.
[5] Bis in idem.
[6] §5º do artigo 1035 do CPC.
[7] Seguro, a Vida e sua Modernidade, Voltaire Marensi, Lúmen Júris, 2008, pág. 8).
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