Brasil,

Obamacare, Trumpcare e o “Possível Care”

  • Crédito de Imagens:Divulgação - Escrito ou enviado por  Marcio Serôa de Araujo Coriolano e Solange Beatriz Palheiro Mendes
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Todos os gestores de saúde do Mundo já aprenderam que qualquer equacionamento da atenção privada à saúde depende de escala, para diluição do risco entre o maior número possível de pessoas. A saúde custa caro em qualquer País. Do lado da demanda, todos querem o melhor tratamento possível. Do lado da oferta, a indústria que fabrica, distribui e utiliza os tratamentos, quer a melhor tecnologia possível. E daí surge a espiral inflacionária da saúde. Que é impossível de ser administrada, na ausência da disciplina do uso responsável dos recursos escassos da saúde. E da escala, do tamanho da mutualidade.

Foi de olho no tamanho que o Obamacare foi fundado. Uma tacada que perecia genial, porque o maior País capitalista do planeta teria resolvido o problema da escala, ao impor que todos os americanos fossem obrigados a comprar um plano de saúde. Nem nos tempos mais favoráveis do socialismo de planejamento centralista um Governo ousou tanto. Na origem do diagnóstico do que nos EUA é alcunhado de “mandato” – a obrigação de comprar -, os formuladores do Affordable Care Act (o nome da lei apelidada Obamacare) atribuíram as exclusões de cobertura e outros males praticados pelas operadoras de saúde americanas à seleção adversa. Esta, na prática, é o efeito de uma demanda perversamente seletiva pelo provimento de saúde: os planos são procurados pelos que mais precisam dele, encarecendo os custos, e, na linha final, os preços. Com a lei, teria sido revogada a lei da seleção adversa.

Após massiva propaganda, antecedida de batalha cruenta entre republicanos e democratas, começaram os períodos de inscrição, buscando alcançar os 20 milhões de americanos sem-plano. Os que não optassem, pagariam pesadas multas. E, efetivamente, muitos aderiram. As operadoras de saúde confiaram no taco de Obama, fixando tarifas menores, inclusivas. Mas a lei da seleção adversa resistiu à revogação. Para espanto geral, um grande exército dos sem-plano resolveu correr o risco de pagar as multas.

E, logo no período pré-eleição presidencial, o Obamacare fazia água por todos os lados. Os custos aumentaram mais do que antes, vários Estados americanos atacaram a lei, grandes operadoras amargaram prejuízos, algumas mesmo se afastando da oferta, e cresceu a raiva dos cidadãos frustrados.

Muitos analistas americanos, independente de coloração no bi-partidarismo peculiar daquele País, atribuem outra parte do fracasso do programa à permanência do modelo de livre ação da indústria da saúde. Mais tratamentos, sem controle do acesso da população ao sistema, e a criação desenfreada de tecnologias no maior País gerador da inovação, resultam em inevitáveis e irreprimíveis custos.

Ninguém sabe o que a equipe do novo presidente Trump fará para recolocar a esperança de milhões de americanos no lugar. O que será “affordable” (comprável, que caiba no bolso) é um enigma que pode consumir capital político da nova administração. Se a obrigação de fazer alguma coisa é um anti-paradigma caro aos republicanos guardiões da livre-iniciativa, igualmente a regulação mais ativa de um mercado de insumos e tratamentos de saúde que movimenta em escala internacional trilhões de dólares mexerá com um monumental vespeiro. Os consumidores americanos esperam o próximo ato. E o mundo também aguarda, atento, o desenlace de um modelo de inclusão social à saúde que reputava vencedor, e que ainda enfrenta graves problemas. O Brasil, decerto, tem muito a refletir e aprender com os acertos e desacertos da política da saúde dos EUA.

Marcio Serôa de Araujo Coriolano, presidente da Confederação Nacional das Empresas de Seguros Gerais, Previdência Privada e Vida, Saúde Suplementar e Capitalização(CNseg) Solange Beatriz Palheiro Mendes, presidente da Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde)

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