A Cobrança de Tributos nas Seguradoras e os Princípios Básicos de uma Justiça Social
Voltaire Marensi
Com a finalidade de divulgar, inicialmente, a parte primeira deste título, cabe informar aos nossos estimados leitores e leitoras, uma decisão recente julgada pelo Supremo Tribunal Federal, que entendeu ser passíveis de cobrança as alíquotas do PIS e Confins oriundas das receitas de bancos, corretoras, cooperativas e seguradoras.
Deveras, o colegiado daquela Corte decidiu, por maioria de votos, que as receitas brutas operacionais decorrentes de atividades dessas instituições financeiras estão sujeitas à tributação.
Pois bem. O PIS e Cofins são tributações elencadas nos artigos 195 e 230 da nossa Constituição Federal.
O primeiro deles é a abreviação de programa de Integração Social e o segundo trata de uma contribuição para financiamento da seguridade social.
O jurista Marco Aurélio Greco, entre outros títulos, doutor em direito pela PUC/SP e ex-professor da Fundação Getúlio Vargas DireitoGV e GVlaw/SP, arremata em seus Comentários ao artigo 195, I, c e §§11 e 13 da Constituição Federal de 1988, o seguinte:“[1]
“É de se ver o quanto foi longe nosso Legislativo Federal, ao definir, como base de cálculo da Contribuição para o PIS e da COFINS, o “faturamento”, que corresponde à “receita bruta” da pessoa jurídica, assim entendido o “total das receitas”, independentemente do tipo de atividade por ela exercida e da classificação contábil adotada para as receitas auferidas no período”.
Destaca também o Informativo Migalhas de ontem, 13/06/23, que para fins de repercussão geral, foi fixada naquela Corte a seguinte tese para o Tema 372:
"As receitas brutas operacionais decorrentes da atividade empresarial típica das instituições financeiras integram a base de cálculo do PIS/COFINS cobrado em face daquelas ante a Lei nº 9.718/98, mesmo em sua redação original, ressalvadas as exclusões e deduções legalmente prescritas."[2]
Prevaleceu, no processo objeto deste julgamento, o voto-vista divergente do ministro Dias Toffoli, que deu parcial provimento ao recurso da União para estabelecer a legitimidade da incidência, à luz da Lei 9.718/98, do PIS sobre as receitas brutas operacionais decorrentes das atividades empresarias das entidades acima citadas.
Ademais, o Supremo Tribunal Federal, prossegue o ministro relator do voto vencedor, “ao assentar a constitucionalidade de tais alíquotas diferenciadas, tem realçado não só as disposições constitucionais que permitem tal diferenciação, mas também a pujante capacidade contributiva desses contribuintes."
Destaco, a meu sentir, ainda pela sua importância no mundo jurídico, o que ensina Fábio Konder Comparato, jurista de renome e de alta qualificação, que trouxe também enorme contribuição ao direito securitário, passagem imperiosa que deve ser transcrita ao sabor de registro inserto no teor da decisão objeto deste artigo. Ensina ele:
“O conceito básico do moderno direito comercial é o de atividade empresarial, substituindo a velha noção de ato de comércio.
Atividade é uma série de atos tendentes ao mesmo escopo. (...) Ora, quem fala em ‘atividade econômica organizada’ supõe um complexo de bens destinados a um escopo produtivo. Sob essa perspectiva deve-se formular a ideia de faturamento sob a perspectiva da natureza e das finalidades da atividade empresarial”.[3] Grifo meu.
Impende sublinhar também outra passagem que faz parte integrante do voto-vista do ministro Dias Toffoli que contém uma máxima da qual não se pode fugir no direito tributário, que é a seguinte:
“O Supremo Tribunal Federal ao assentar a constitucionalidade de tais alíquotas diferenciadas, tem realçado não só as disposições constitucionais que permitem a tal diferenciação, mas também a pujante capacidade contributiva desses contribuintes”.[4]
Seguramente que esta decisão representou uma vitória da União com impactos para bancos, corretoras, cooperativas e seguradoras.
Ao ensejo não posso deixar passar in albis o tema sempre esquecido de parte de nossos legisladores, entre alguns outros, em sede de tributação.
Trata-se do Imposto sobre grandes fortunas (IGF) que na verdade é um tributo que está contemplado em nossa Constituição Federal, mas até o presente momento ainda não regulamentado.
Cuida-se de um imposto federal, de competência exclusiva da União, nos termos do artigo 153 da CF/88, que diz:
Compete à União instituir impostos sobre:
.........
VII – grandes fortunas, nos termos de lei complementar.
Qual seria o motivo da omissão de nossos legisladores que até hoje não implementaram este imposto em nosso país???
Em rápida consulta no Google está dito que é possível elencar, ao menos, quatro controvérsias em torno do IGF expostas abaixo:
- No Brasil, políticos, tributaristas e economistas divergem se o IGF é um instrumento eficaz de arrecadação ou de diminuição da concentração de renda e riqueza.
- Definir qualitativamente e quantitativamente o que é uma grande fortuna, pode consistir mais do que o sentido coloquial de milionário.
- Definir se o IGF deve recair apenas sobre pessoas físicas residentes ou também sobre pessoas jurídicas constituídas no Brasil e no exterior.
- A instituição do IGF poderia incitar um aumento em fraudes de declaração emitidas por pessoas consideradas possuidoras de grandes fortunas com o intuito de “camuflar” sua real posição social e se esquivar da obrigatoriedade do recolhimento.[5]
Data vênia em que pese opiniões abalizadas acima exaradas, remontaria aos três princípios de Ulpiano básicos da lei romana e adotado séculos depois como lema e regra de princípios éticos e morais:
“Viver honestamente, a ninguém ofender e, aqui, no ponto da questão dolorida, dar a cada um o que é seu.”
Acredito assim, que se valendo o Estado como um todo de seu real poder de império, se poderão criar novas fontes de recursos impostos coercitivamente aos administrados, mas, sempre pautadas através de normas austeras e justas, dentre um critério equânime que determinada parcela da população, independentemente de cargo ou posição política ou social, dê, de fato, sua real contribuição com o fito de se construir uma eficiente e duradoura Justiça Social.
É o que penso, s.m.j.
Porto Alegre, 14 de junho de 2023
Voltaire Marensi - Advogado e Professor
[1] Comentários à Constituição do Brasil. Coordenação Científica J.J. Gomes Canotilho, entre outros. Editora Saraiva, entre outras, 2013, página 1916.
[2] https://www.migalhas.com.br/quentes/388080/stf-decide-que-sao-exigiveis-pis-e-cofins-de-receitas-de-bancos.
[3] Excerto da decisão no RE 609.096
[4] Parte final da redação de terça-feira, 13 de junho de 2023 do Informativo Migalhas.
[5] Pt.m.wikipedia.org
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