Especialistas alertam irresponsabilidade fiscal como principal perigo na retomada econômica em tempos de pandemia
Maílson da Nóbrega e Ana Paula Vescovi discutiram os impactos da Covid-19 no setor durante evento da Câmara Espanhola
Diante de uma crise sanitária como a que vivemos atualmente com a pandemia de Covid-19, a saúde deve ser a principal preocupação de governantes e cidadãos. Porém, já é claro que os impactos vão além deste setor e chegam a absolutamente todos os componentes das sociedades afetadas pelo vírus. Na economia não seria diferente, com o fechamento do comércio e alterações em diversos outros membros do setor de serviços, o desemprego segue crescendo e os desafios para a retomada econômica se mostram grandes e perduráveis.
A fim de auxiliar na compreensão e frisar a importância desse assunto, a Câmara Oficial Espanhola de Comércio no Brasil realizou o evento "Projeções Econômicas: Impactos da Crise e Perspectiva de Retomada", nesta sexta-feira, 14. Em parceria com o Santander, a discussão contou com a participação de Maílson da Nóbrega, sócio da Tendências Consultoria e ex-ministro da Fazenda, e de Ana Paula Vescovi, economista chefe do Banco Santander, ex-secretária executiva do Ministério da Fazenda.
A mediadora Alessandra Ribeiro, diretora de macroeconomia e análise setorial da Tendências Consultoria, iniciou o debate com aquelas que se mostrou preocupação unânime entre os participantes: a irresponsabilidade fiscal. Segundo a especialista, o desequilíbrio das contas públicas poderia jogar o Brasil em um caminho pessimista. Declaração endossada por Ana Paula Vescovi, que apesar de acreditar nas vacinas como protagonista na superação da crise sanitária ainda em 2020, afirmou que a crise econômica irá reverberar pelos próximos anos em todo o mundo.
"O Brasil possui algumas vantagens no seu processo de entrada na crise. Nós temos termos um setor externo bem equilibrado, com câmbio flexível que ajusta as relações de demanda e oferta com o resto do mundo. As exportações são outro ponto positivo, tivemos uma safra agrícola fenomenal, somada ao dólar alto, foi um colchão amortecedor". Porém, a especialista alerta para a ociosidade econômica, que se se tornou ainda maior no cenário brasileiro. "Estimamos queda de -6,4% do PIB em 2020, com recuperação de 4,4% em 2021, mas nossa projeção sugere recuperação do nível de atividade pré-Covid somente a partir de 2023".
Do ponto de vista fiscal, Vescovi afirma que "é assustador que já estejamos no sétimo ano de déficits fiscais, traduzindo, estamos há sete anos pagando impostos altos que não cobrem as despesas do setor público. Entendemos que neste ano o déficit será monumental em função de despesas temporárias. Porém, é preciso estar atento a condução dessas despesas para que o Brasil trilhe um caminho de recuperação e se torne o país que desejamos, de inclusão e crescimento".
Além de partilhar a mesma preocupação sobre o ponto de vista fiscal da crise levantada por Vescovi, Maílson da Nóbrega, trouxe o viés político como importante aliado na recuperação econômica, principalmente no que diz respeito a tratativas internacionais. "A mudança de postura do presidente Bolsonaro nos últimos tempos, sem entrevistas polêmicas e afrontas constantes auxilia na redução das tensões que costumam pairar sobre seu governo. Consequentemente há uma aprovação maior de seu mandato que já pode ser vista na última pesquisa Datafolha e há também uma facilidade maior em operar o presidencialismo de coalisão". Nóbrega acredita que esses fatores aproximam o empresariado brasileiro de investimentos nacionais e auxiliam na imagem do país no exterior.
Pensando em estratégias, Nóbrega afirma que não se pode fazer um ajuste da dívida sem o aumento da carga tributária. "Do meu ponto de vista, é necessário um aumento temporário setorizado. Não podemos aumentar a tributação sobre o consumo, mas acredito no aumento sobre renda e propriedade, de maneira temporária, sem compartilhamento com estados e municípios".
São inúmeras as questões que envolvem a retomada da economia no Brasil e no mundo. Infelizmente não será uma caminhada rápida e os atalhos podem ser grandes emboscadas com impactos ainda maiores a longo prazo. Porém, com responsabilidade e consciência dos governantes, rumaremos de volta a uma economia sustentável e a sermos um país de fato emergente.
O debate pode ser conferido na íntegra pelo link:
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