Os impactos da COVID-19 em instrumentos financeiros
*Por Lucio Anacleto e Rodrigo Bauce
Esta temporada de balanços anuais entrará para a história com o movimento atípico do mercado em função da pandemia global ocasionada pelo novo coronavírus (COVID-19). O principal desafio agora será refletir os prováveis impactos nas operações das empresas ao longo deste ano. Nesse sentido, as ações de reguladores são de extrema importância para refletir medidas governamentais e corporativas que visam reduzir o impacto sistêmico do COVID-19 ao medir perdas de crédito esperadas, mensuração de valor justo, modificações substanciais de ativos financeiros, descontinuidade das relações de hedge (proteção a risco de mercado), impactos em divulgações, entre outros assuntos relacionados ao tema ´Instrumentos Financeiros´.
Na Europa, o órgão regulador do mercado financeiro (European Securities and Markets Authority) publicou algumas orientações para promover a aplicação consistente das normas internacionais de contabilidade, refletindo sobre as medidas que visam reduzir o impacto da pandemia ao estimar perdas de crédito de acordo com a norma de instrumentos financeiros IFRS 9/CPC 48. O IASB (International Accounting Standards Board), órgão internacional que define as melhores práticas contábeis, publicou recentemente que, ao aplicar a norma, será necessário considerar os efeitos do COVID-19 intensificando o uso de dados macroeconômicos e aspectos prospectivos na avaliação de aumento significativo do risco de crédito das operações e na mensuração de perdas de crédito esperadas com base em informações razoáveis e sustentáveis, disponíveis sem custo ou esforço excessivos. Assim, ao avaliar as condições de previsão, deve-se considerar tanto os efeitos da covid-19 quanto as medidas significativas de apoio do governo que estão sendo tomadas.
Seguindo esta linha de raciocínio, no Brasil, a atuação da autoridade monetária tem como objetivo, em momentos de crise de grande porte, manter a liquidez e resiliência dos mercados financeiros. Neste sentido, as medidas de combate aos efeitos da COVID-19 levam em consideração que o potencial de desorganização econômica se eleva em decorrência de que esses mercados operam naturalmente alavancados e o não funcionamento dos mercados levaria a uma perda de confiança com impacto nos preços dos ativos.
O Banco Central do Brasil também se manifestou, em função de eventuais impactos da COVID-19 na economia, aplicando critérios temporários para fins de gerenciamento de risco de crédito. As medidas temporárias para apoio econômico provenientes do Banco Central consideraram a redução da alíquota do compulsório sobre recursos a prazo e ampliação de linha de crédito para instituições financeiras. Os grandes bancos brasileiros já se comprometeram a conceder períodos de carência em determinados produtos, enquanto o BNDES lançou medidas de reforço de caixa para viabilizar atividades de empresas em diversos setores.
Este é um desafio que vai além das instituições financeiras e de uma forma mais ampla e se estende a todas as empresas que estão expostas ao risco de não pagamento, postergação ou renegociação de prazos e valores de contas a receber. O mercado enfrenta, agora, uma tensão para conciliar debates como alterações de cláusulas contratuais, quebra de covenants, flexibilização de condições de pagamentos e reestruturação de dívidas.
Será um desafio avaliar por quanto tempo o choque econômico pode persistir e quais setores serão mais impactados antes que ocorra uma reversão de tendências com a estabilização da capacidade de pagamento de longo prazo e como o apoio do governo pode mitigar este choque. A situação atual requer uma avaliação de medidas de apoio econômico por ações do governo e grupos corporativos. Neste sentido, algumas ações podem gerar modificação substancial de um ativo financeiro e impactando o resultado das companhias em função de desreconhecimento.
Outros efeitos precisam ser considerados, assim como os riscos de mercado, tais como a variação cambial, taxa de juros e preços de ativos como, por exemplo, as commodities. Além de estruturas complexas de negociação de mercado, como os derivativos, existem muitas cláusulas contratuais contingentes que estão embutidas nos contratos de compra e venda para combinação de negócios. Refletir a volatilidade de mercado, assim como condições de riscos financeiros neste momento, pode ser algo realmente desafiador e consequentemente levar ao maior uso de subjetividade, julgamento e inputs não observáveis de mercado ampliando as incertezas em modelos de apreçamento de ativos.
Existe ainda, o debate sobre a extinção da LIBOR, que é a taxa livre de risco que será descontinuada ao final do próximo ano. Mesmo sem alteração no calendário previsto, os efeitos do COVID-19 nitidamente trazem desafios no debate de ajuste de risco de crédito já que algumas das taxas de referências alternativas não possuem garantias.
Estar capitalizado e com caixa forte em um momento de crise pode representar blindagem e poder de barganha em algumas negociações. A gestão de caixa das empresas se torna um ponto importante de atenção pois agora será necessário conciliar fôlego financeiro, análise de tomada de crédito, gestão de ciclo operacional e atenção a estruturas de hedging em função da alta volatilidade do mercado. Importante destacar que a aplicação da contabilidade de hedge demanda um monitoramento particular da relação de proteção na determinação do relacionamento econômico e efetividade. Alterações em termos contratuais, relação de dominância de risco de crédito ou condições inicialmente estabelecidas, podem gerar instabilidade na relação de hedging acarretando a descontinuidade e impactos no resultado.
Importante notar que os efeitos de uma eventual aceleração do vírus gerariam consequências comportamentais relevantes. O apetite de risco dos investidores demonstrou queda significativa afetando o preço dos ativos negociados em bolsa e um prolongamento do cenário seria ainda mais delicado. Curiosamente o ambiente de incerteza tem provocado constante comparação do cenário atual com os efeitos observados na crise de 2008. Além dos mencionados IFRS 9 (CPC 48) e IFRS 13 (CPC 46), foi após a crise que a norma de divulgação de instrumentos financeiros IFRS 7 (CPC 40) tomou força ao discutir as divulgações de riscos de crédito, liquidez e mercado.
Como já orientado pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM), transparência nas divulgações é relevante. Considerar a alteração da situação atual, as tendências e as medidas do governo para amenizar os efeitos desta crise é bastante sensível ao tema relacionado aos instrumentos financeiros.
*Lucio Anacleto é sócio da KPMG e Rodrigo Bauce é sócio diretor da KPMG.
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