Fake news: da mídia à justiça (e vice-versa)
Mário Rosa*
As fake news estão ultrapassando os prejuízos financeiros e de credibilidade nas empresas e invadindo o judiciário com dezenas de processos. E não são somente pedidos de indenizações por danos morais ou materiais, mas também de pessoas e empresas que estão tendo que se defender de coisas que foram acusadas inveridicamente.
Notícias falsas são, muitas vezes, plantadas por concorrentes “rejeitados” pelo mercado. Eles encomendam textos bem escritos, porém com dados falsos, provenientes de “associações e órgãos” com nomes que inspiram credibilidade, mas que não existem e, portanto, são impossíveis de serem rastreados. Também adicionam entrevistas de “especialistas”, sejam pessoas que aceitam propinas para isso ou colocam nomes de “profissionais” que sequer existem. Às vezes, até providenciam documentos falsos e manipulados, para “embasar” a acusação.
O próximo passo é conseguir disseminar as fake news na mídia. Jornalistas e veículos sérios não divulgam nada que não consigam checar. A tarefa cabe a pessoas e canais que, ou não costumam verificar a informação, ou até aceitam vantagens - inclusive pecuniárias - para assumir o risco de divulgar notícias falsas. Eles agem protegidos pela liberdade de imprensa. Mas há uma enorme distorção do que é liberdade de imprensa e responsabilidade por parte dessas pessoas. As mentiras são grotescas. É um problema enorme que as empresas estão enfrentando.
Vou contar uma situação que aconteceu com um dos meus clientes: a Tecnobank, empresa nacional que desenvolve soluções que geram segurança aos processos eletrônicos dos segmentos financeiro e de veículos. Por ser líder de mercado em diversas praças e atuar em um segmento no qual a credibilidade é determinante, a Tecnobank tem sido atacada pela concorrência, que utiliza essa estratégia de "plantar" fake news como uma maneira de manchar a reputação da empresa.
Um periódico online da Paraíba e outro do Paraná publicaram fake news como “denúncia”. Elas se espalharam como rastilho de pólvora na internet, indiscriminadamente copiadas por outras mídias de baixa credibilidade, sem que fossem verificadas e sem que os “acusados” fossem ouvidos pela reportagem.
Depois que os responsáveis pelas fake news conseguem plantar as informações mal-intencionadas na mídia, eles reúnem o material publicado (clipping) e passam a acionar diversos órgãos públicos para que investiguem a suposta fraude. Acionam Tribunal de Contas, Ministério Público, Vara de Fazenda Pública, etc. Eles chegam a estes órgãos sempre com o mesmo assunto e repetindo os argumentos. No caso Tecnobank, os concorrentes perderam em todas as instâncias, mas nunca desistiram. Eles seguem procurando o próximo órgão público e insistem na suposta denúncia. Acontece que essas "notícias" que acusam a empresa de fraudes no Detran de São Paulo foram apresentadas a diversos órgãos oficiais, até que o Ministério Público de São Paulo, diante das publicações de supostas "denúncias", aceitou abrir investigação acerca da suposta fraude.
Independentemente se é certo ou errado, verdade ou mentira, a partir do momento em que alguém pede a abertura de investigação com supostas "acusações oficiais da imprensa" ao Ministério Público, o simples fato do órgão aceitar abrir essa investigação já pode virar notícia em veículos de grande repercussão e credibilidade. Afinal, trata-se de uma sólida empresa, de grande reputação, em um mercado que movimenta milhões de reais mensalmente, que está sendo acusada de uma fraude de R$ 500 milhões junto a um órgão oficial.
Ou seja, mesmo que a acusação seja baseada em mentiras, a manchete "Ministério Público de São Paulo investiga fraude de R$ 500 milhões da Tecnobank" não deixa de ser verdade. E o que nasceu de uma fake news na imprensa marrom, chega à primeira página do Google. A perda de clientes é apenas um dos prejuízos financeiros que as empresas enfrentam quando viram alvo de fake news. Organizações com denúncias – mesmo que inverídicas – têm a reputação manchada. E a reputação corporativa é hoje o principal ativo intangível de uma marca, que chega a representar 84% do valor de mercado da empresa, atualmente, segundo o S&P 500. Clientes, investidores e até mesmo fornecedores não desejam vincular o nome a uma empresa com denúncias na internet. Isso gera perda de receita, queda no faturamento, demissões e redução nos investimentos - o que impacta a economia nacional.
Felizmente, o MP e demais órgãos investigam e descobrem que as denúncias são infundadas, arquivando os processos. Porém, e o que já foi dito?
*Mário Rosa é especialista em gestão de crises, autor brasileiro pioneiro e com o maior número de obras sobre imagem e reputação.
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