Reajuste no seguro de transporte – Imprevisibilidade
Aparecido Mendes Rocha
O alarmante aumento do roubo de cargas registrado este ano no Brasil, principalmente no Rio de Janeiro tem sido uma das principais preocupações para os embarcadores, transportadores e para as companhias de seguros. De acordo com dados da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), 87,8% das ocorrências de roubo de carga no Brasil em 2016 foram registradas no RJ (9.862 casos) e em SP (9.943 casos).
O quadro atual é muito grave e reflete diretamente no seguro de transporte. Algumas seguradoras já recusam cobrir a entrega de mercadorias no Estado do RJ, outras exigem reajustes nas taxas do seguro e alterações nos planos de gerenciamento de riscos.
Para as renovações de apólices e seguros novos, as seguradoras agravam as taxas, diminuem o limite por embarque, aumentam a franquia (no seguro facultativo) e estabelecem rigorosas regras de gerenciamento de riscos ou simplesmente não aceitam o seguro.
Entretanto, nos seguros em vigor, por uma disposição legal, as seguradoras estão impedidas de alterar as condições do contrato durante a sua vigência, mesmo que a apólice contenha uma cláusula de revisão. Qualquer cláusula de revisão, só poderá ser aplicada na renovação da apólice. Essa medida é necessária para preservar os direitos dos segurados e não permitir que as seguradoras que aceitaram conscientemente clientes com péssimos resultados anteriores agravem a taxa quando novos sinistros ocorrerem.
Outro ponto desfavorável para a seguradora é que ela não pode cancelar uma apólice por aumento de sinistralidade, ainda que o cancelamento durante a vigência esteja previsto em cláusula de revisão, pois perante o ordenamento jurídico brasileiro esta cláusula é considerada nula.
Há de se considerar que quando fatores imprevisíveis ocorrem, como a explosão recente do roubo de cargas no RJ, motivado principalmente pela falência do Estado e fragilidade da policia, o impedimento de reajuste das condições de seguro se torna uma regra prejudicial às seguradoras. Nessas circunstâncias, se não houver bom senso por parte dos órgãos reguladores com a permissão de readequação do seguro, certamente muitas seguradoras deixarão de operar no segmento de transporte nacional e as que persistirem correrão sérios riscos de extinção.
A favor das seguradoras está a questão da imprevisibilidade do aumento vertiginoso da ocorrência do risco crítico (grandes perdas, roubos cinematográficos, grande quantidade de carga, ineficiência prática de todo e qualquer método de gerenciamento de risco) em um curtíssimo espaço de tempo e que ficou fora dos padrões atuariais. Para definir a taxa e condições do seguro, as seguradoras utilizam toda uma estrutura técnica atuarial com conhecimentos específicos de matemática estatística e financeira através do binômio índice de ocorrência x tempo de análise. Assim, a previsibilidade atuarial utilizada pela subscrição é variante dos estudos e histórico de ocorrências durante um determinando período. No caso específico do RJ, entende-se que foi considerado que ao longo dos últimos 10 anos o roubo se manteve sempre em um patamar alto, mas razoável e com os sinistros controlados dentro das provisões das seguradoras.
A previsibilidade a partir da técnica atuarial utilizada para o desenvolvimento do seguro é uma forte justificativa para desqualificar o impedimento do reajuste de apólices quando a experiência fugir do controle da seguradora. Contudo, a imprevisibilidade matemática e atuarialmente demonstrada unido com a flagrante falência institucional do Poder Público caracterizado pela total ausência das forças policiais de segurança pública é um fator jurídico que permite, em tese, a seguradora pleitear a revisão das condições do seguro em vigor para novo ajustamento do equilíbrio contratual e/ou até mesmo proceder o cancelamento da apólice por impossibilidade de continuidade da garantia. Para os segurados, é bem melhor aceitar a renegociação, do que não ter onde colocar seu seguro.
Como o Estado do RJ não tem recursos para enfrentar a criminalidade e as empresas já chegaram no limite da busca por proteção contra roubos, não são as companhias de seguros que terão a solução para combater essa anomalia social. Os segurados expostos ao risco RJ, obviamente, não tem responsabilidade contratual pelo desiquilíbrio atuarial provocado pela explosão de sinistralidade; porém, todos os demais segurados que não estão sob o risco RJ, mas integram a mutualidade daquela operação não podem ficar com essa conta.
Aparecido Mendes Rocha, especialista em seguros internacionais
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