Abril Verde passa pelo combate ao assédio sexual nas empresas
A campanha Abril Verde visa prevenir acidentes de trabalho, promovendo a conscientização sobre a importância da segurança e da saúde do trabalhador brasileiro e tem como principal objetivo alertar a população de que acidentes de trabalho não ocorrem por acaso, mas por descaso, chamando a atenção das empresas e da sociedade sobre as vantagens da prevenção. Tal campanha é de fundamental importância em um país como o Brasil em que, segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), foram comunicados, entre 2012 e 2022, 6,7 milhões de acidentes de trabalho.
Quando pensamos em acidentes de trabalho é comum fazermos uma referência a acidentes que causam lesões ou danos físicos. Tal pensamento, inclusive, encontra embasamento em dados do Observatório de Segurança e Saúde no Trabalho que demonstra que as lesões mais frequentes ocasionadas aos trabalhadores são cortes, lacerações, feridas contusas e punctura.
No entanto, é importante lembrar outra forma de lesão que impacta diretamente os trabalhadores e que vem crescendo ao longo dos anos: os danos provocados à saúde mental. O próprio Observatório nota uma crescente na concessão de auxílios-doença concedidos por depressão, ansiedade, estresse e outros transtornos mentais e comportamentais (acidentários e não acidentários). Em 2022 foram mais de 200 mil novas concessões, um aumento de 3% em relação ao ano anterior.
Práticas de assédio moral e sexual no ambiente de trabalho, sem dúvida, contribuem para referida estatística, visto que causam extremo abalo psíquico nas vítimas, atingindo o seu psicológico de forma perversa e duradoura. Segundo pesquisa realizada pelo Think Eva e o Linkedin, uma em cada seis vítimas de assédio sexual pede demissão, e 28% das vítimas desenvolvem sintomas como ansiedade e depressão.
Buscando frear principalmente o assédio sexual no ambiente de trabalho duas importantes leis foram editadas entre 2022 e 2023, tanto no âmbito da administração pública quanto no âmbito das empresas privadas. Tais legislações se relacionam diretamente com a campanha do Abril Verde e o seu propósito de prevenção de acidentes de trabalho, devendo tais ser observadas pelas empresas e órgãos da administração pública não apenas no mês de abril, mas no ano todo.
No que tange às empresas privadas, a Lei 14.457/22 instituiu o programa Emprega + Mulheres determinando a obrigatoriedade das empresas para prevenir e combater o assédio sexual e outras formas de violência no ambiente de trabalho.
O artigo 23 da referida Lei determina que é competência da Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e Assédio (Cipa) a inclusão de regras de conduta a respeito do assédio sexual e de outras formas de violência nas normas internas da empresa, que deve implementar procedimentos claros para recebimento e acompanhamento de eventuais denúncias e apuração dos fatos, e aplicar sanções administrativas aos responsáveis diretos e indiretos pelos atos de assédio e violência, sempre garantindo o anonimato do denunciante.
É também da Cipa a obrigação de sempre incluir temas referentes à prevenção e ao combate ao assédio sexual e outras formas de violência em suas práticas, devendo o debate e prevenção acerca de tal tema fazer parte da cultura da empresa.
Uma das maiores inovações da legislação, no entanto, recai sobre a realização, no mínimo a cada 12 meses, de ações de capacitação, orientação e sensibilização dos empregados e empregadas de todos os níveis hierárquicos da empresa sobre temas relacionados à violência, ao assédio, à igualdade e à diversidade no âmbito do trabalho, em formatos acessíveis e apropriados.
As obrigações previstas na legislação são obrigatórias para todas as empresas, com mais de 20 funcionários, que possuírem Cipa. Frise-se que as empresas tiveram até 21 de março de 2023 para se adequarem ao previsto pela Lei 14.457/22, devendo as obrigações legislativas serem cumpridas sob pena de multa e fiscalização pelo Ministério Público do Trabalho, bem como sob pena de propositura de ações judiciais.
No que tange à administração pública a Lei instituiu o Programa de Prevenção e Enfrentamento ao Assédio Sexual e demais Crimes contra a Dignidade Sexual e à Violência Sexual e, dentre outras disposições, determinou que devam ser criados programas de capacitação que abranjam tópicos como: causas estruturantes do assédio sexual, consequências para a saúde das vítimas, meios de identificação, modalidades e desdobramentos jurídicos, direito das vítimas, mecanismos e canais de denúncia, bem como instrumentos jurídicos de prevenção e enfrentamento ao assédio sexual.
Verifica-se, portanto, que o intuito de ambas as legislações é promover o debate e a capacitação dos funcionários acerca da prática de assédio sexual e outras formas de violência no ambiente de trabalho, principalmente através da realização de treinamentos periódicos para capacitação.
Focar na capacitação e informação dos funcionários é focar justamente na prevenção e promoção de um ambiente de trabalho sadio, exatamente o que a campanha do Abril Verde visa promover. Assim, é fundamental que nesse mês (e ao longo do ano) as empresas foquem também nos impactos que práticas abusivas no ambiente de trabalho podem ocasionar na saúde, principalmente mental, dos funcionários e que visem coibir de todas as formas a prática de assédio sexual e outras formas de violência, contando com as legislações mencionadas como aliadas.
Beatriz Vendramini Rausse, Advogada, Mestre em Direito Europeu e Sócia da Borguezi e Vendramini Advogadas
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