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Conta da saúde suplementar pesa para todos

  • Crédito de Imagens:Divulgação - Escrito ou enviado por  Carol Rodrigues | Revista Cobertura
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A fraude, a incorporação das novas tecnologias e a judicialização são assuntos que impactam diretamente as operadoras de planos de saúde e também os beneficiários. Aproximar o setor dos seus consumidores tem sido foco de trabalho de instituições como Associação Brasileira de Planos de Saúde (Abramge) e Federação Nacional de Saúde Suplementar (FenaSaúde).

Enquanto os consumidores estão preocupados com os valores elevados dos planos de saúde, as operadoras monitoram os custos preocupadas com a sustentabilidade do negócio e a qualidade da prestação de serviços aos 51 milhões de beneficiários do sistema de saúde suplementar no Brasil. Medidas são adotadas para frear os custos considerados desperdícios ou fraudes visando o equilíbrio. O grande detalha é que, de certa forma, algumas acabam penalizando os beneficiários. Afinal, sob o guarda-chuva do mutualismo tudo é compartilhado. Mas como a comunicação circula entre os eixos ainda é algo a ser melhorado.

“Não há mensagem mais equivocada do que a que o plano de saúde é obrigado a pagar. Na verdade quem paga são as pessoas. Os planos são intermediários. As pessoas são responsáveis pelo mutualismo. Temos de ser atenciosos com esses processos para não criarmos desigualdades, criar benefícios para uns em detrimento do custo maior para todos, porque a conta é rateada”, destaca Anderson Mendes, representante da Unidas Autogestões.

A mais recente discussão em voga permeia o reembolso assistido e o reembolso de forma geral. Afinal, o reembolso virou uma ferramenta para a prática de fraude, com a ciência ou não do beneficiário.

“A questão é muito mais abrangente do que um simples reembolso”, destaca Cristiano Plate, advogado especialista em saúde suplementar e direito médico hospitalar. “O reembolso acaba sendo um dos carros-chefes da fraude”, acrescenta.

Vera Valente, diretora-executiva da FenaSaúde, ressalta o quanto chama a atenção o aumento significativo do valor com solicitações de reembolso. “De 2019 a 2022 houve uma alta de 90% nesta despesa. Saímos de R$ 6 bilhões em 2019 para quase R$12 bilhões em 2022”.

Luiz Celso Dias Lopes, presidente do Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), destacou o estudo realizado pela EY, que aponta o custo de fraudes e desperdícios no valor de R$ 34 bilhões, em 2022.

“O estudo também traz sugestões para reduzir o impacto das fraudes em todo o setor. É necessário uma atuação integrada pensada em toda a cadeia, incluindo o poder público.”

Para Leonardo Sica, vice-presidente da OAB São Paulo, é necessário refletir em como é para o cidadão, já habituado ao que o plano de saúde cobre ou não, receber em seu aplicativo avisos de que conforme decisão da 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), não há reembolso.

“O que se passa em nível de compreensão para o cidadão que tem que digerir uma decisão do STJ para conseguir o reembolso de consulta médica. Por que a questão chegou no TJ que é uma corte superior? A única maneira de encontramos meios de simplificar algo tão importante como o reembolso da saúde é colocar todos em uma mesa e ouvir todos os lados”, analisa Sica.

Reembolso assistido: modelo de negócio

“O que é um reembolso?”, questiona Antônio Westenberg, representante da Academia Nacional de Seguros e Previdência (ANSP). “Ele é um evento indenizável, ou seja, algo que decorreu de um risco segurável. Nem todo risco é segurável. Para que ele seja segurável, tem de ser economicamente viável e o valor econômico deve ser calculável. Na hora que acontece o dano, ele não pode ser manipulável por nenhuma das partes, nem pela companhia de seguros, nem pelo consumidor ou terceiro envolvido no processo. A perda tem de ser aleatória”, explica.

“O reembolso deixou de ser uma característica de produto, em algum momento nos últimos quatro anos, para virar um modelo de negócio de prestação de serviço em saúde. Quando acontece isso muda-se totalmente a lógica. Passo a ter mais profissionais de saúde atuando via reembolso enxergando como um modelo de negócio”, explicou superintendente executivo da Abramge.

A diretora da FenaSaúde lembra que o reembolso é um item das despesas assistenciais e ele será considerado no momento do cálculo do reajuste. “Esse valor não sai do bolso da operadora, mas sim da contribuição que todos os beneficiários fizeram para pagar o plano de saúde. Temos o desafio enorme, como operadora ou prestador, de fechar os ralos. Uma coisa é o desafio de financiar tecnologias caras, que é enorme e um desafio para o mundo inteiro. Mas, como país pobre, não podemos nos dar o luxo de que os beneficiários e os planos de saúde estejam sendo utilizados para beneficiar poucos, de forma ilegal e fraudulenta”, pontua Vera, sobre a grande mensagem que a FenaSaúde tem buscado passar.

Após o aumento das despesas com reembolsos, agora aumentam também as despesas com judicialização. “A judicialização cresce gradativamente. Segundo dados do CNJ, no ano passado foram contabilizadas aproximadamente 570 mil ações na área da saúde, sendo 350 mil na saúde pública (aumento de 15,4% de 2022 para 2023) e 220 mil na saúde suplementar, aumento de 13,5%. A grande maioria por falta de cobertura”, destaca Dr. Richard Pae Kim, representante do Tribunal de Justiça de São Paulo.

“Quanto mais a gente aperta do ponto de vista de sistema para que as coisas tenham uma dinâmica mais positiva, extrapola o outro lado. O sistema se molda e busca outras formas de modelos de negócios. Parte desse aumento precisa ser investigado porque é muito recurso do contratante que está em voga”, analisa Novais.

Na visão de José Silvio Toni, presidente do SindiPlanos, o reembolso é, inclusive, parte do que é um plano de saúde, e uma modalidade de cobertura fundamental. “Quando nós representamos um plano de saúde, nós aprendemos o que esse plano cobre. Tudo que foi dito sobre a dificuldade do reembolso é, na verdade, uma dilapidação do que é um plano de saúde. Ele precisa respeitar a liberdade de quem quer pagar o serviço de tantos outros médicos que não trabalham com reembolso. Portanto, toda essa situação prejudica o sistema”, expõe.

Cenário transitório: como melhorar

Para Westenberg, o canal de vendas tem que ter a responsabilidade para apresentar ao consumidor quais são os seus direitos e responsabilidades.

“A cada 60 dias, a ANS acrescenta procedimentos no rol obrigatório. Cabe ao mercado fazer seus diferenciais de produto acrescentando coberturas. Na minha opinião, tem-se que ter um contrato muito bem formulado com as exclusões claramente estabelecidas, de forma que estes procedimentos estejam sempre referidos ao momento em que o contrato foi assinado. Por exemplo, no dia que assinei, tinha 300 procedimentos de cobertura, 60 dias depois eles viraram 350. É necessário chegar ao consumidor e perguntar: você quer fazer um aditivo no contrato para colocar mais 50? E não da forma como é hoje”, sugere.

Os representantes da FenaSaúde e da Abramge apontam a necessidade de avançar na legislação, na comunicação e no engajamento da sociedade.

“Precisamos conscientizar e comunicar melhor. Estamos em um momento em que temos o grande desafio de melhorar a nossa comunicação com o beneficiário e com a rede, médicos e prestadores. Precisamos dar mais transparência e convidar a sociedade para entender melhor os nossos modelos”, ressalta Novais.

“É importante que o consumidor entenda de maneira mais clara como funcionar a relação de causa e efeito na saúde suplementar para que possa construir também, dentro da sua alçada, comportamentos mais responsáveis”, destaca o procurador geral da ANS, Daniel Tostes.

O presidente do IESS lembra que embora não seja possível acabar com as fraudes, dá sim para mitigar os seus efeitos, diminuir as suas práticas e se antecipar aos seus efeitos.

“O fraudador corre na frente. Temos que criar mecanismos que dificultem ao fraudador, mesmo que isso passe por dificultar um pouco a utilização do mecanismo do reembolso. Não eliminá-lo e ferir o contrato ou as normas da ANS, mas sim criar requisitos que não permitam que o fraudador saia na frente”, ressalta Lopes.

Na visão de Mendes, durante a pandemia houve uma onda de liberação e agora há uma onda de restrição. “Iremos trabalhar para que possamos ser mais assertivos no controle desses processos”.

“Não devemos situar o consumidor no centro do problema. Ele tem de ser centro da solução”, ressalta o procurador da ANS.

Para ele, boa parte da solução passa justamente pelo reconhecimento do papel de cada um dos agentes envolvidos de alguma maneira com a regulação do saúde suplementar. “Todas as entidades têm papel relevante na reconstrução do setor”, diz Tostes, que atribui o problema do reembolso à falta de comunicação e relacionamento entre os agentes envolvidos.

Os médicos e o papel da auditoria

A qualidade do exercício da profissão é um ponto abordado por César Eduardo Fernandes, presidente da Associação Médica Brasileira (AMB). “Vivemos um momento terrível em relação à formação médica. Nos últimos dez anos, dobramos o número de escolas médicas em municípios pequenos. Esses médicos serão acolhidos pelas operadoras”.

Ao lembrar a tônica da conversa de judicialização e excessos, ele aponta que não dá para mensurar a atividade médica em decorrência de poucos que não atuam corretamente. “Não são os médicos que estão comprometendo o custeio da saúde”, defendeu.

Ele enfatiza a necessidade de se investir na boa formação do médico. “Muito provavelmente iremos diminuir essas questões que estão sendo discutidas”.

No meio desse contexto surge o papel do auditor médico como o profissional que ajuda na sustentabilidade desse sistema. “O auditor médico está lá para apontar uma inconformidade, seja um reembolso sem desembolso, reembolso fraudulento ou uma fraude cometida dentro de estruturas hospitalares”, comenta Goldete Priszkulnik, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Auditoria Médica (SBAM), ao lembrar o caso das Órteses, próteses e medicamentos especiais (OPME). “Quem apontou isso foi a auditoria médica”.

O assunto foi debatido pela Comissão de Direitos Médicos e da Saúde da OAB São Paulo promoveu no início de abril uma audiência pública para discutir o reembolso assistido com representantes do setor de saúde e de entidades que representam o consumidor, além do órgão regulador. “É o início de uma grande diálogo, de uma evolução dentro da nossa área de saúde”, comenta Juliana Hasse, presidente da Comissão de Direito Médico e Saúde da OAB São Paulo.


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