Diferencial competitivo: O potencial do Brasil para a produção de hidrogênio de baixo carbono

O Acordo de Paris, assinado em 2015 por 195 países, estabelece o compromisso de manter o aumento da temperatura global abaixo de 2°C, com esforços para limitá-lo a 1,5°C. Deste modo, é exigido a redução significativa das emissões de gases de efeito estufa (GEE), principalmente no setor energético que representa hoje dois terços das emissões globais. Nesse contexto, surge a Economia do Hidrogênio como uma solução promissora, capaz de armazenar energia, impulsionar a transição para fontes renováveis e reduzir a dependência de combustíveis fósseis.

O destaque do hidrogênio nas discussões do setor energético se dá pelo impulsionamento da redução de custos, convergência com objetivos de descarbonização e diversidade de usos, posicionando-o como um vetor energético limpo. O hidrogênio baixo carbono, que pode ser produzido por diferentes tecnologias e insumos como a água ou biomassa, torna-se uma opção atraente para integrar energias renováveis na geração de energia, distribuí-la entre regiões, descarbonizar setores de transporte e indústria, além de ser uma matéria-prima limpa para diversos processos industriais.

Evidenciando o potencial do hidrogênio como alternativa à utilização de combustíveis fósseis, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) decidiu incluí-lo no Programa de Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PDI). Iniciado no dia 7 de junho e com finalização prevista para 24 de julho, as propostas de projetos de hidrogênio envolvendo fontes renováveis estão em consulta pública e é esperado que possam trazer de modo mais embasado o grau inovador desta alternativa.

Com um olhar atento para os movimentos geopolíticos nesse tema, o Brasil tem a oportunidade de se posicionar como um protagonista nessa transição energética. O hidrogênio de baixo carbono tem se destacado como uma das alternativas mais promissoras para a economia, e em um país com vastos recursos naturais e uma posição de liderança no agronegócio global, o potencial para a produção de hidrogênio de baixo carbono é inegável.

De acordo com um estudo desenvolvido em junho de 2023 pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), considerando diversos resíduos orgânicos e setores produtivos, o Brasil apresenta um potencial técnico expressivo na produção de hidrogênio a partir de biogás de resíduos. Em 2021, o potencial técnico total do país correspondia a 23% do consumo mundial, e as projeções indicam que este ano esse número poderá alcançar entre 13% e 23%, de acordo com cenários traçados pela Agência Internacional de Energia (IEA). No que diz respeito à ureia agrícola - fertilizante agrícola bastante utilizado devido à sua eficácia na produtividade- o potencial técnico de produção é 30 vezes maior do que a demanda atual.

Hidrogênio verde

O conceito de hidrogênio verde, que consiste na geração do gás por meio da eletrólise utilizando energia elétrica renovável sem depender da rede de distribuição, pode ser visto como uma tentativa de impor tecnologias específicas, desconsiderando as especificações e certificações relacionadas ao hidrogênio de baixo carbono. Nesse sentido, o Brasil tem a oportunidade de ir além e explorar diversas formas de produção deste tipo de gás, como o uso de biodigestores de dois estágios que possibilitam a obtenção direta de hidrogênio e indireta a partir do metano do biogás. Este segundo, posteriormente, pode passar pelo processo de reforma a vapor, gerando um ciclo de produção

Um dos setores que se beneficiaria significativamente dessa transição é o agronegócio brasileiro. O país é um grande produtor de alimentos, mas ainda dependente de importações de fertilizantes. A produção de fertilizantes nitrogenados através do hidrogênio verde representa uma oportunidade estratégica para o desenvolvimento da cadeia do hidrogênio e a redução da dependência externa. Além disso, nos setores de transporte e sistema elétrico, o hidrogênio pode desempenhar um papel fundamental na descarbonização.

No entanto, antes de pensar em exportação, é crucial que o Brasil explore todas as possibilidades de agregar valor em suas cadeias produtivas. Investir em pesquisa e desenvolvimento pode tornar os processos de produção de hidrogênio ainda mais eficientes e sustentáveis. Felizmente, algumas dessas tecnologias de produção por biomassa já demonstraram ter uma característica de carbono negativo, o que pode ser um diferencial competitivo importante no mercado internacional.