Ar doente: a ameaça silenciosa à boa saúde em edifícios
Arquitetura e design juntos para melhorar qualidade de vida
Você já ouviu falar na Síndrome do Edifício Doente (SED)? O termo é usado para descrever situações em que os ocupantes de um edifício experimentam efeitos agudos na saúde e bem-estar, que parecem estar relacionados ao tempo que passam no edifício, mas sem identificação de uma causa ou doença específica. As queixas podem se concentrar em áreas específicas ou abranger todo o edifício.
O problema é detectado em ambientes das mais diversas tipologias de edifícios, quando a qualidade do ar e sua circulação não são adequadas ou dentro dos padrões exigidos. Isto se dá quando um edifício é operado ou mantido de maneira inconsistente com seu projeto original ou procedimentos operacionais prescritos. Às vezes, problemas com o ar interior são resultado de um projeto inadequado do edifício ou das atividades dos ocupantes. No Brasil, a Anvisa e a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) criaram critérios para definição do que é o ar de boa qualidade, a partir da Portaria 3.523/98 do Ministério da Saúde.
Indicadores de SED incluem situações em que os ocupantes do edifício reclamam de sintomas associados ao desconforto agudo, como dor de cabeça, irritação nos olhos, nariz ou garganta, tosse seca, pele seca ou com coceira, tontura e náusea, dificuldade de concentração, fadiga e sensibilidade a odores. Nesses casos, maioria dos reclamantes relata alívio pouco depois de sair do edifício.
De acordo com o arquiteto e designer de interiores, Nicholas Gennari, CEO da Nar Design Studio e criador de projetos biofílicos premiados, o design biofílico pode ser uma solução para eliminar ou pelo menos diminuir os efeitos negativos da SED. Segundo a Global Market Insights, o mercado global de design biofílico, avaliado atualmente em US$ 30,8 bilhões, deverá alcançar US$ 98,8 bilhões até 2025, a partir de projetos de design e arquitetura.
Estudos e projetos concluídos com o uso da biofilia apontam para uma melhoria dos ambientes habitados pelas pessoas, não só ao melhorar a estética e a experiência sensorial dos ocupantes, mas também ao demonstrar impactos positivos na qualidade do ar interior. “Plantas internas não apenas absorvem poluentes, mas também regulam a umidade e reduzem o estresse, sendo essenciais para mitigar os sintomas associados à Síndrome do Edifício Doente (SED), como dores de cabeça, irritação nos olhos e fadiga.”, ressalta Gennari.
O design biofílico não se limita apenas à fase de construção, mas também influencia as práticas de manutenção e operação dos edifícios. Estratégias como a escolha de materiais de construção sustentáveis, a maximização da ventilação natural e a criação de espaços flexíveis, que promovem a interação com a natureza, são fundamentais para sustentar os benefícios no longo prazo.
Os vilões da SED
Os maiores responsáveis pela má qualidade do ar na construção de ambientes internos vêm de fontes de dentro do edifício, dentre eles os formaldeídos, poeira, compostos voláteis de tintas usadas na pintura das paredes, além de um grupo de substâncias oriundas de uma série de produtos, chamadas Compostos Orgânicos Voláteis (COVs), presentes, por exemplo, em produtos de limpeza, máquinas fotocopiadoras, vernizes, revestimentos de pisos, dentre outros. Fatores externos como por exemplo poluentes de veículos podem entrar no edifício por aberturas de entrada de ar mal localizadas, janelas e outras aberturas. Há ainda contaminantes biológicos como Bactérias, mofo, pólen e vírus. Esses contaminantes podem proliferar em água estagnada que se acumulou em dutos, umidificadores e bandejas de drenagem, ou onde água se acumulou em telhas de teto, carpetes ou isolamentos.
Há ainda que se destacar a circulação de ar com filtração deficiente, que acumula matéria orgânica e umidade, que disseminados no ar, podem contribuir para o desenvolvimento de uma ampla gama de micro-organismos, que estão entre as principais causas dos sintomas relacionados à SED. Na grande maioria dos casos, os sintomas apresentados não são graves ou incapacitantes, mas causam piora das condições laborais, diminuição da produtividade e perdas econômicas em unidades corporativas.
SED gera custos significativos para os governos
Nesse sentido, diversos estudos e pesquisas comprovam que a SED gera custos significativos para os governos, tanto em termos de despesas com saúde quanto com perda de produtividade; aumento das despesas com consultas médicas, exames, medicamentos e internações. Doenças e problemas de saúde causados pela SED podem levar, ainda, ao aumento do absenteísmo no trabalho, impactando a produtividade dos setores e gerando custos com licenças médicas e substituições, segundo pesquisas.
Para Nicholas Gennari, um projeto de design deve favorecer a ventilação natural através da disposição estratégica de janelas, portas e outros elementos arquitetônicos, permitindo a circulação constante de ar fresco e a renovação do ar interno, porém, a correta projeção de sistemas de climatização eficientes é um fator essencial e deve ser considerada e adequada às necessidades do edifício, otimizando o uso de energia e reduzindo a emissão de poluentes.
“O profissional responsável pelo projeto deve maximizar o quanto possível a renovação do ar interno ao mesmo tempo que deve considerar outros elementos arquitetônicos para contrabalancear o gasto extra de energia que o projeto terá como por exemplo brise-soleil, fachadas duplas, e estudo de orientação geográfica. Outra solução é o uso de materiais com baixa emissão de Compostos Orgânicos Voláteis (COVs), priorizando materiais de construção, revestimentos, tintas e mobiliário com baixa emissão desses compostos, minimizando a presença de poluentes no ar interno”, ensina o arquiteto e designer.
Outro aspecto destacado por Gennari é que os padrões de ventilação nos códigos de construção estabelecem o mínimo necessário para o conforto e bem-estar; no entanto, muitos sistemas não são operados ou mantidos para garantir que essas taxas de ventilação de projeto sejam fornecidas. “O profissional responsável pelo projeto deve ter em mente que o “mínimo” não significa “ideal” e sempre que possível projetar focando em padrões consideravelmente superiores aos mínimos estabelecidos pelas autoridades”, complementa o profissional.
Outras dicas:
- O design deve considerar soluções que facilitem a limpeza e a manutenção do edifício, como pisos de fácil limpeza, revestimentos resistentes e acessos facilitados para áreas técnicas.
- Deve priorizar materiais duráveis e resistentes à umidade, mofo e fungos, minimizando a necessidade de reformas e manutenções frequentes.
- Deve incentivar a cultura da manutenção preventiva de sistemas de ar-condicionado através de campanhas de conscientização e sinalização adequada para os pontos que necessitam de atenção regular.
- Deve se evitar ao máximo o uso de materiais que liberem compostos orgânicos voláteis. Lembrando que o uso de amianto crisotila está proibido em território nacional desde 2017 e não pode ser usado em edificações.
- instituição de restrições ao fumo;
Histórico da SED
A SED foi reconhecida em 1982 pela Organização Mundial da Saúde (OMS), após comprovarem a morte de 34 pessoas e 182 casos de contágio da bactéria Legionella Pneumophilia, ocasionados pela contaminação do ar interno em um hotel na Filadélfia. A partir do final do século XIX e início do XX, a urbanização acelerada levou à construção de grandes edifícios com sistemas de ventilação fechados. O objetivo era otimizar o controle climático e reduzir custos de energia, mas isso diminuía a circulação de ar fresco e a qualidade do ar interno. Na década de 1970, a crise do petróleo impulsionou a busca por edifícios mais eficientes energeticamente. Isso resultou em projetos com maior vedação e isolamento térmico, o que intensificou o problema da má qualidade do ar interno. A popularização de materiais de construção sintéticos, como carpetes, tintas e móveis, liberou compostos orgânicos voláteis (COVs) no ar interno. Esses COVs podem causar diversos sintomas relacionados à SED. A proliferação de mofo, bactérias e outros microrganismos em sistemas de ventilação mal conservados também contribui para a SED.
Sobre Nicholas Gennari
Nicholas Gennari é arquiteto e designer, formado pela Fundação Armando Alvares Penteado, uma das mais prestigiadas e respeitadas instituições acadêmicas do Brasil e historicamente conhecida por sua abordagem artística e relevância cultural. Fez extensão em sustentabilidade e preservação histórica na Universidade de Artes de Florença, na Itália. Após três anos de experiência no mercado residencial, Nicholas frequentou a Miami International University of Art & Design, onde se formou como designer de interiores nos EUA. Nicholas é designer de interiores certificado pelo NCIDQ e registrado pelo Conselho de Arquitetura e Design de Interiores no estado da Flórida. Atualmente, é CEO e Designer de Interiores do NAR Design Studio.
Projetos premiados
O trabalho realizado pela NAR Design Studio recebeu reconhecimento em diversos prêmios, incluindo o SBID International Design Awards 2021, IDA Design Awards, 2021, Luxe Red Awards, 2022, German Design Awards 2023, Iconic Awards – innovative architecture, 2023, Paris Design Awards, 2023, Paris Design Awards, 2024, Seaglass Awards, Florida Design, 2024 – Seaglass Awards, Florida Design, 2024 – Editor’s Choice, BUILD Architecture Awards e South East USA Prestige Awards 2022.
Fonte: https://www.epa.gov/sites/default/files/2014-08/documents/sick_building_factsheet.pdf
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