Gestão ambiental produtiva une público diversificado no Dia do Cerrado
"Quem produz também cuida" discute como atividade agropecuária e conservação podem andar juntos no Cerrado
O evento em comemoração ao Dia do Cerrado reuniu produtores rurais, estudantes, professores, pesquisadores, parceiros, extensionistas rurais de todas os biomas em defesa da interação entre produção agropecuária e preservação do Cerrado. Com o tema Quem produz também cuida, pesquisadores da Embrapa Cerrados e instituições parceiras discutiram como aliar a atividade agropecuária e o cuidado com o meio ambiente, que não precisam estar dissociados.
O pesquisador Felipe Ribeiro apresentou o conceito de gestão ambiental produtiva, por meio da qual é feita a integração de pesquisa e transferência de tecnologia para o gerenciamento da propriedade rural. Tudo começa com o diagnóstico da área, para identificar se existem nascentes, área de preservação permanente e reserva legal e o histórico e funcionamento dos sistemas agrícolas. “Com o diagnóstico, é possível saber onde erramos e assim podemos melhorar essa paisagem. O pensamento da sustentabilidade tem que estar também na agricultura, para que o processo de recuperação ambiental possa ser feito como um todo na propriedade rural”, reflete. Com a melhor estruturação do funcionamento da propriedade rural, o produtor também terá mais sucesso econômico.
Ferramentas para isso já existem. A Embrapa e instituições parceiras oferecem sistemas de Tecnologia da Informação para cada uma das etapas da gestão ambiental produtiva – diagnóstico, planejamento, implantação e monitoramento.
Para as áreas agrícolas há o Pasto Certo, o WebAgritec, o SatVeg, entre outros. Na área ambiental, o WebAmbiente oferece uma série de informações sobre espécies nativas que podem ser usadas no processo de adequação ambiental da paisagem rural. Em homenagem ao Dia do Cerrado, a plataforma ganhou mais um recurso – um livro digital com cerca de 200 perguntas e respostas que contemplam as principais dúvidas dos produtores sobre o código florestal e a recomposição do Cerrado para atender a nova legislação. Ribeiro dá um exemplo: se a dúvida é sobre como elaborar um roteiro de recuperação de área degradada, a resposta traz informações sobre todas as etapas para elaboração do projeto, um exemplo de roteiro, além de documentos, imagens e vídeos, tudo em formato digital.
Outras novidades para a sustentabilidade do Cerrado
Outro lançamento foi o folder Estratégias para recuperação e renovação e pastagens degradadas no Cerrado. Esse é o mais novo instrumento para auxiliar o pecuarista na gestão da sua propriedade. Uma escala de 1 a 6 define o estágio de degradação da pastagem. Apresentado em formato prático para ser levado ao campo, traz informações para facilitar a identificação da situação da área, com auxílio de imagens e gráficos.
“A degradação de pastagens é um dos problemas mais sérios da pecuária brasileira, que causa danos ambientais e também para toda a sociedade. O folder ajuda o produtor a entender a situação em que ele está e a fazer o diagnóstico de sua propriedade”, detalha o pesquisador da Embrapa Cerrados, Luiz Adriano Cordeiro, um dos autores do folder, que também teve colaboração da Embrapa Gado de Corte.
A publicação surgiu a partir de dúvidas muito comuns entre os pecuaristas: O que e como fazer para reverter a degradação das pastagens? Quanto custam essas alternativas? Quais serão os resultados?
As respostas estão todas ali, incluindo qual é a melhor opção para recuperação, de acordo com a situação da propriedade. Estão detalhados os resultados esperados e o tempo desse retorno; o ganho em peso animal e em produtividade (de carne e de leite); taxa de lotação; o custo operacional das melhorias, em dólar por hectare.
O folder está disponível para download gratuito na página da Embrapa.
Outro destaque foi a Estante Virtual da Coleção Cerrado, plataforma para download gratuito de livros clássicos sobre o bioma, desenvolvidos ao longo da história da Embrapa Cerrados. São onze títulos que abordam temas como caracterização e recuperação de matas de galeria, aproveitamento alimentar e correção do solo e adubação.
Projetos em prol de uma agricultura sustentável
O evento mostrou ainda que o Cerrado é reconhecido, em níveis nacional e internacional, por sua importante colaboração na produção de alimentos. A Agência Alemã de Cooperação Internacional (GIZ) tem apoiado o Brasil em várias políticas públicas que beneficiam a região. Seu representante, Taiguara Alencar, alerta: “Para um futuro sustentável, é preciso agregar tanto a produção, o bioma Cerrado é fundamental para o agro, como a conservação, a proteção. Tem que haver um equilíbrio. Acreditamos que trabalhando com essas duas frentes, é possível esse equilíbrio”.
Já o secretario de Inovação, Desenvolvimento Rural e Irrigação do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa), Fernando Camargo, ressalta a importância do FIP Paisagens Rurais, um projeto de gestão integrada da paisagem que atende sete estados do bioma Cerrado. A meta é recuperar 100 mil hectares de pastagens degradadas. Para Camargo o sucesso desse grande projeto se reflete também na agricultura de baixo carbono, linha que o Brasil tem apostado para melhorar a sustentabilidade da atividade.
Coordenado pelo Serviço Florestal Brasileiro (SFB), com parceria da Embrapa e do Serviço Nacional de Aprendizagem Rural (Senar), quase 2 mil propriedades rurais receberam assistência técnica e gerencial no âmbito do projeto, desde 2018, por mais de 120 técnicos de campo.
A sustentabilidade das propriedades rurais é tratada de forma individualizada, pelo conhecimento da área e da realidade do produtor para fazer a gestão da propriedade. “Nós entendemos que levar essa inovação ao campo passa pela transferência de tecnologia, até ela chegar à mão do produtor. Quando analisamos o fator de produção, com certeza, comparando dados dos censos agropecuários de 2006 a 2017, vimos que a tecnologia, sem dúvida, foi o fator de produção que contribui para todo esse avanço”, pontua Rafael Diego, técnico da coordenação do FIP Paisagens Rurais na Diretoria de Assistência Técnica e Gerencial pelo Senar.
Pastagens degradadas – nova fronteira agrícola do Brasil
O tema Pecuária também foi discutido por Giovana Maciel. A pesquisadora da Embrapa Cerrados enfatiza que o pecuarista tem que ser um agricultor, tem que encarar sua lavoura, de pastagem no caso, de forma mais profissional para conseguir um melhor retorno. Sobre a degradação ela é categórica: “Se a pastagem for enxergada como uma cultura, essa situação pode ser revertida”.
Com base em dados referentes à área de pastagem degradada e as taxas de lotação atuais, Maciel informa que, dos 600 mil km2 de pastagens existentes no Brasil, se em apenas 10% forem implantados sistemas silvipastoris para aumentar o potencial de intensificação da atividade pecuária, serão 5,5 milhões de hectares com potencial para aumento da produtividade: “A nova fronteira agrícola do Brasil são as pastagens degradadas, que podem ser melhoradas e liberadas para consórcio com plantios agrícolas”. A pesquisadora completa: “Intensificar o uso de terras em áreas agrícolas, aumentar a eficiência dos sistemas de produção, sem prejudicar o equilíbrio ambiental, é fundamental”.
Cerrado visto do alto
Outra linha de trabalho essencial para o desenvolvimento sustentável do Cerrado é baseada em imagens aéreas. Pelas peculiaridades do bioma, que é composto por três formações vegetais, com grandes variações climáticas e uma variada dinâmica do uso da terra, essa atividade no Cerrado é bastante difícil. Ainda assim a equipe da Embrapa Cerrados conseguiu resultados impactantes ainda na década de 1990, segundo o pesquisador Edson Sano. Com base nas informações coletadas, foi lançado o livro Sistemas de Informações Geográficas na Agricultura, o primeiro sobre geoprocessamento escrito no Brasil.
Outra conquista foi o Zoneamento Agrícola de Risco Climático (Zarc). Lançado em 1996, o sistema é usado até hoje como política pública para liberação de crédito agrícola e seguro rural pelo Mapa. “O Zarc foi produzido na Embrapa Cerrados usando a tecnologia inicial do geoprocessamento. O diferencial na época é que conseguimos espacializar os dados de precipitação, que até então eram apenas dados pontuais derivados das estações pluviométricas do Inmet [Instituto Nacional de Meteorologia]”, relata Sano.
Já em 2005, usando cenas geradas pelo satélite Landsat, foi possível responder uma pergunta aparentemente simples: Quanto de cada bioma estava sendo utilizado com atividade agropecuária? Para a resposta, não tão simples, foram usadas quase 120 cenas para gerar uma única imagem. E foi assim que se soube, pela primeira vez, quanto do Cerrado estava sendo usado para agropecuária (39%) e quanto estava em seu estado natural (61%). O estudo foi publicado em 2009 na revista Pesquisa Agropecuária Brasileira (PAB), editada pela Embrapa, e ainda hoje é o terceiro artigo mais citado da revista.
No evento, o pesquisador destacou uma tecnologia que, segundo ele, está vindo pra ficar: o levantamento via drone. “Nós conseguimos monitorar o nível de produtividade, se é a produção é homogênea, se tem variações. Em área de formação florestal, conseguimos fazer a quantificação da biomassa, medir a densidade de uma espécie. A qualidade de imagem que o drone consegue permite desenvolver pesquisas em uma escala de 1:1”.
Minas Gerais, Tocantins, São Paulo, Rio Grande do Sul, Bahia, Goiás, Mato Grosso do Sul, Maranhão, Distrito Federal e Uruguai –mais de cem pessoas acompanharam a transmissão ao vivo do evento. “Super importantes esses conhecimentos. Precisamos fazer isso chegar ao produtor e que ele tenha um acompanhamento no dia a dia”, sugere no chat a ONG Em Defesa da Vida.
A gravação do evento está disponível na íntegra no canal da Embrapa no YouTube.
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