Até as condições mínimas de trabalho estão em risco na Engenharia
*José Manoel Ferreira Gonçalves
O ministro que sugeriu “passar a boiada” no Congresso nem está mais no governo, mas o espírito de afronta aos direitos dos brasileiros continua a ser norma em Brasília. E a Engenharia, de tantos serviços prestados à Nação, segue totalmente apartada do necessário debate nacional em torno dessas temerárias reformas.
Está no Senado, após aprovada pela Câmara dos Deputados, a infame Medida Provisória 1.040/2021, que pretende instalar um processo de “desburocratização para aumento de competitividade e modernização do ambiente de negócios no país”. Na prática, isso significa mais precariedade nas relações entre empresas e sua mão de obra, com a consequente extinção de direitos conquistados a duras penas pela classe trabalhadora.
Na esteira das mudanças asseveradas pela MP 1.040, engenheiros e agrônomos poderão sucumbir a mais uma dilapidação das já difíceis condições de atuação profissional a que estão submetidos, fruto em grande parte da inócua atuação de seus representantes – notadamente o Confea, Conselho Federal de Engenharia e Agronomia, e também o CREA de São Paulo, que deveria defender os interesses da categoria no mais importante mercado do país.
A aprovação definitiva da MP 1.040 implica a revogação dos dispositivos da Lei 4.950-A/66, que há mais de cinco décadas estabeleceu o salário mínimo profissional de engenheiros, arquitetos, agrônomos, médicos veterinários e químicos.
E essa não é a única proposta com contornos nocivos para a atividade dos engenheiros. No texto que seguiu para a apreciação dos senadores, a MP 1.040 estabelece também a emissão automática, sem a avaliação profissional, de licenças e alvarás de funcionamento para atividades consideradas de risco médio. Um absurdo, verdadeiro atentado à segurança pública!
Ao transformar definitivamente em lei, a MP também permitirá que os conselhos profissionais notifiquem extrajudicialmente devedores de anuidades, inclusive com a possibilidade de inclusão em cadastros de inadimplentes.
Como bem apontado em nota do Sindicato dos Engenheiros da Bahia, a medida provisória proposta pelo Executivo trata de assunto diverso da emenda apresentada pelo deputado Alexis Fonteyne (Novo-SP) e está “na contramão do movimento majoritário dos congressistas e da sociedade no estabelecimento do piso nacional para os enfermeiros e profissionais de saúde, a exemplo do que existe para os profissionais contemplados na Lei 4.950-A/66”. A isonomia de direitos que pautou os avanços para os valorosos profissionais da saúde será seriamente abalada com essa famigerada Medida Provisória.
Nessa fase do processo, com a matéria já aprovada pela Câmara, cabe à sociedade civil reagir de forma organizada para alertar o Legislativo sobre os graves impactos advindos da eventual entrada em vigor da MP 1.040.
Entidades representativas, como os sindicatos de engenheiros e a CNTU, Confederação Nacional dos Trabalhadores Liberais Universitários, já se mobilizam para levar ao Congresso a manifestação de repúdio dos profissionais contra a MP 1.040, tão obscura em seus propósitos que nos deixa, mais uma vez, perplexos com a desfaçatez de nossos políticos.
*José Manoel Ferreira Gonçalves é engenheiro e presidente da FerroFrente (Frente Nacional pela Volta das Ferrovias)
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