Febre amarela, uma luta sem correria
Confira o artigo do secretário de Saúde de São Paulo publicado na Folha de S.Paulo
Desde 1942 o Brasil não registra casos de febre amarela por transmissão urbana. Naquela época, o vetor da doença era o Aedes aegypti, mosquito que atualmente transmite dengue, zika vírus e chikungunya.
O Aedes chegou a ser erradicado do país na década de 1950, mas retornou em meados dos anos 1980. Trinta anos depois, mesmo com altos índices de infestação do mosquito registrados nos últimos tempos em municípios brasileiros, a febre amarela urbana não ressurgiu, diferentemente da dengue.
Não há, por hora, evidências de que o Aedes aegypti continue a ser um potencial transmissor de febre amarela nas cidades. Entretanto, como gestores de saúde, não queremos pagar para ver. A mobilização para combater o mosquito deve seguir intensa.
Os casos e mortes por febre amarela surgidos neste ano a partir do Estado de Minas Gerais - mas que já chegaram a São Paulo e ao Espírito Santo, além de suspeitas em investigação no Tocantins e na Bahia-, são silvestres, contraídos em regiões rurais e de mata e transmitidos por outros mosquitos, entre eles o Haemagogus e o Sabethes.
Os macacos, mais sensíveis aos ataques desses mosquitos, contraem o vírus da febre amarela ao serem picados e logo adoecem e morrem. As epizootias (óbitos de primatas) são, portanto, o primeiro indicador da circulação do flavivírus.
As autoridades de saúde devem cumprir seu papel, a partir da identificação de mortes de macacos e também de casos suspeitos em humanos, e adotar as medidas sanitárias pertinentes, como a aplicação de vacinas contra febre amarela na população que reside em áreas de risco de transmissão da doença, devidamente identificadas pelo Ministério da Saúde.
Mas as pessoas não devem, de forma indiscriminada, correr aos postos de saúde, sem necessidade, para tomar a vacina. Basicamente devem ser imunizadas os que moram nas áreas de risco de transmissão de febre amarela e aquelas que pretendem viajar para esses locais. Fora isso, não há necessidade e nem é indicada a vacinação.
Não há, no momento, razão que justifique alterar o protocolo de vacinação. O esquema adotado na rede pública é de duas doses, tanto para crianças a partir dos nove meses de idade quanto para os adultos. Quem não tomou a vacina quando criança deve tomar duas doses, com intervalos de dez anos, mas somente se for viajar ou reside em área de risco.
Crianças com menos de seis meses, idosos, grávidas, mulheres que estão amamentando bebês de até seis meses, pacientes imunodeprimidos ou em tratamento de câncer não devem receber o medicamento. As exceções precisam ser discutidas individualmente.
A vacina é segura e eficaz, com poucos efeitos colaterais. Já a vacinação indiscriminada aumenta o risco do desenvolvimento de febre amarela vacinal, evento raro mas que pode ocorrer, uma vez que o produto é obtido a partir do flavivírus enfraquecido.
O governo do Estado de São Paulo está em alerta e trabalhando, em parceria com os municípios, intensificando a vacinação em regiões em que foram identificadas epizootias e casos suspeitos e confirmados de febre amarela e promovendo operações mata-mosquito em zonas rurais e de mata.
O objetivo é conter um eventual avanço da doença, que no momento não se configura. Não há motivo para pânico ou corrida aos postos de vacinação do Estado.
David Uip é médico infectologista e secretário de Estado da Saúde de São Paulo
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