Seguro de Vida: Quando a Intenção Criminosa Impede a Indenização?
Decisão recente do STJ sublinha a importância de proteger o bem maior que é a vida humana e desestimular práticas fraudulentas
José Marciano da Silva Neto
No campo do direito securitário, a questão da validade dos contratos de seguro de vida em situações em que o beneficiário está envolvido na morte do segurado levanta importantes debates jurídicos. Um caso recente ilustra bem essa complexidade.
No último dia 5 de dezembro, em Uberlândia, no Triângulo Mineiro, a Polícia Civil de Minas Gerais prendeu um homem de 42 anos, suspeito de ter causado a morte de sua esposa para receber cerca de R$ 1 milhão de seguro de vida. As investigações apontam que ele teria manipulado um acidente automobilístico, em que ele era o motorista, desativando previamente o airbag do lado do passageiro, não utilizando o cinto de segurança da vítima, para concretizar seu plano. A ação evidencia um claro desvio de finalidade do contrato de seguro, uma vez que o beneficiário, ao causar intencionalmente a morte do segurado, age de maneira ilícita.
Uma decisão da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) publicada em setembro reforça a nulidade de contratos de seguro em contextos similares. No caso analisado, uma mulher que contratou seguro sobre a vida de seu marido foi acusada de ser a mandante de seu homicídio. Apesar de o Tribunal de Justiça do Paraná ter inicialmente considerado que a nulidade do contrato deveria afetar apenas o beneficiário envolvido no ato ilícito, o STJ decidiu que a nulidade é absoluta, atingindo todos os beneficiários.
A ministra Nancy Andrighi, relatora do recurso no STJ, destacou que, segundo o Código Civil, contratos de seguro devem proteger um interesse legítimo na preservação da vida do segurado. Quando o contratante, visando obter a indenização, atua para ceifar a vida do segurado, o contrato se torna nulo por violação aos princípios legais que regem o seguro de vida. O artigo 790 do Código Civil reforça que o proponente deve demonstrar interesse legítimo na vida do segurado, salvo prova em contrário.
A relatora enfatizou que, mesmo que a legislação não especifique as consequências da falta de interesse em proteger a vida do segurado, aplica-se o artigo 166, inciso VII, do Código Civil, que dispõe que o negócio jurídico é nulo quando a lei proíbe sua realização sem, contudo, impor uma penalidade específica.
No contexto dos seguros de vida, a decisão do STJ sublinha a importância de proteger o bem maior que é a vida humana e desestimular práticas fraudulentas. Assim, mesmo que outros beneficiários aparentemente legítimos existam, se o contrato for celebrado com intenções espúrias, a indenização é inviabilizada.
Esses casos ressaltam a necessidade de uma análise criteriosa ao lidar com contratos de seguro de vida, especialmente em situações de suspeita de fraude. As decisões judiciais servem como um alerta para as seguradoras e para os potenciais contratantes sobre as consequências jurídicas de atos ilícitos, garantindo que o sistema securitário opere de forma justa e em conformidade com os princípios legais.
* O número do processo não foi divulgado em razão de segredo judicial.
José Marciano da Silva Neto é advogado no escritório Rücker Curi – Advocacia e Consultoria Jurídica.
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