Uma Solução Integrada em Sede Securitária
Sob o título “Da Desindexação na Reforma do Código Civil”, os juristas Marco Aurélio Bellize e Ricardo Campos apresentaram um artigo muito bem lançado em um site jurídico,[1] abordando que uma das grandes novidades na Reforma do Código Civil, teria sido a inserção de um nono livro voltado, exclusivamente, para o direito digital.
Deveras. Sem dúvida. O avanço tecnológico trouxe significativas mudanças na forma como os contratos são firmados e executados, incluindo os contratos de seguro. O direito digital, como ramo emergente, aborda as implicações jurídicas dessas transformações. Este artigo procura explorar o impacto do direito digital nos contratos de seguro, a par de uma solução integrada desta matéria, destacando aspectos como a contratação eletrônica, a proteção de dados pessoais e o uso de inteligência artificial, entre outras rápidas e breves considerações pertinentes ao tema.
A contratação eletrônica de seguros facilita a celebração de contratos de maneira mais rápida e eficiente. As seguradoras utilizam plataformas online para oferecer apólices, permitindo que os consumidores adquiram seguros sem a necessidade de deslocamento físico. No entanto, essa facilidade traz desafios jurídicos específicos, pois para que um contrato eletrônico seja válido, ele deverá atender aos mesmos requisitos dos contratos tradicionais, tais como capacidade das partes, objeto lícito e forma prescrita ou não defesa em lei, tudo como está normatizado em nosso atual Código Civil.
A Lei nº 13.105/2015, que instituiu o atual Código de Processo Civil e a Medida Provisória nº 2.200-2/2001, que criou a Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileiras (ICP-Brasil), garantem a autenticidade, integridade e validade jurídica dos documentos eletrônicos.
A assinatura digital, baseada em certificados digitais emitidos por autoridades certificadoras credenciadas, confere validade e eficácia jurídica aos contratos eletrônicos de seguro. A utilização da certificação digital assegura que o documento não foi alterado após sua assinatura, além de identificar inequivocamente as partes envolvidas.
A proteção de dados pessoais é um aspecto crucial no direito digital, especialmente no contexto dos contratos de seguro, que frequentemente envolvem informações sensíveis dos segurados.
Além disto, a Lei nº 13.709/2018, conhecida como Lei Geral de Proteção de Dados -LGPD -, regulamenta o tratamento de dados pessoais no Brasil. As seguradoras, portanto, devem adotar medidas de segurança para proteger os dados dos segurados, bem como obter consentimento explícito para o tratamento dessas informações. A transparência no uso dos dados e o respeito aos direitos dos titulares são fundamentais para a conformidade com a LGPD.
A LGPD impõe obrigações rigorosas às seguradoras, que devem implementar políticas de privacidade e proteção de dados. O descumprimento dessas normas pode resultar em penalidades severas, incluindo multas significativas. Além disso, as seguradoras devem estar preparadas para responder a incidentes de segurança e violações de dados, garantindo a proteção contínua dos dados pessoais.
A par destes novos institutos a inteligência artificial está revolucionando o setor de seguros, desde a análise de risco até a liquidação de sinistros. No entanto, a utilização daquela Lei, ainda levanta questões jurídicas e éticas consoante o entender de especialistas na área.
Pois bem. A inteligência artificial permite a análise rápida e precisa de grandes volumes de dados, melhorando a avaliação de risco e a precificação das apólices. Contudo, é necessário garantir, segundo a avaliação de experts deste novel tema, que os algoritmos utilizados sejam transparentes e não discriminatórios. A falta de transparência nos processos automatizados pode levar a questionamentos sobre a imparcialidade e a equidade das decisões tomadas por sistemas imbricados ao próprio uso da inteligência artificial.
A automação na resolução de sinistros, certamente irá agilizar o processo melhorando a experiência do cliente. No entanto, a confiabilidade dessas ferramentas e a possibilidade de erro precisam ser monitoradas de perto. As seguradoras devem assegurar que os sistemas automatizados sigam critérios objetivos e justos na análise e resolução dos sinistros.
É fato já constatado que o direito digital impõe novos desafios e oportunidades para os contratos de seguro. A contratação eletrônica, a proteção de dados pessoais e o uso de inteligência artificial são aspectos centrais que requerem atenção e conformidade com as normas jurídicas vigentes. As seguradoras que adotarem essas práticas de maneira responsável e transparente estarão mais bem posicionadas para ganhar a confiança dos consumidores e operar de forma eficiente no mercado digital.
A contínua evolução tecnológica e a adaptação das leis são essenciais para garantir que o setor de seguros acompanhe as inovações, promovendo segurança jurídica e proteção dos direitos dos consumidores.
Segundo ficou assente no artigo referenciado pelos autores supra mencionados “a migração da vida cotidiana para o mundo digital e sua penetração nos mais diversos campos econômicos desafiam práticas e relações jurídicas, bem como o próprio conceito de direito, colocando a necessidade de que este reflita adequadamente este cenário - razão pela qual o novo livro se revela fundamental para lidar com os desafios de uma sociedade cada vez mais digital. Trata-se, continuam aqueles doutrinadores, “de iniciativa que visa estabelecer bases legais claras e sólidas para uma série de questões e relações sociais permeadas pelas novas tecnologias, demonstrando a maturidade e a importância que o Direito Digital assumiu nas últimas décadas, não como uma mera prática transversal perante as demais áreas do direito (como no início da internet), mas com um grau de especialização típica de uma matéria que estrutura a própria sociedade moderna”.[2]
Continuo eu. Por intermédio de contratos inteligentes - smart contracts - se pode automatizar a execução de ações predefinidas quando certas condições são atendidas, reduzindo a necessidade de intervenção manual e, consequentemente, o risco de erro humano.
Soluções integradas frequentemente se conectam com outros sistemas corporativos permitindo uma visão mais abrangente dos riscos e suas interdependências.
A maioria dessas soluções pode ser customizada para atender às necessidades específicas de uma organização e escalada conforme o crescimento dos negócios.
Porém, essas soluções também apresentam desafios, incluindo o custo elevado de implementação, a complexidade na integração com sistemas legados e a dependência de um único fornecedor, que pode representar um risco em si.
Todavia, em um mundo cada vez mais interconectado e suscetível a riscos variados, a proteção financeira e a gestão de riscos são fundamentais para a sustentabilidade das empresas. Recentemente, segundo noticiou a mídia, o Banco BV anunciou uma parceria estratégica com a Lockton, uma das maiores corretoras de seguros independentes do mundo. Esta colaboração visa oferecer soluções abrangentes de proteção de crédito e gerenciamento de riscos climáticos e cibernéticos, destacando-se como uma inovação significativa no mercado de seguros brasileiro.[3]
A proteção de crédito é uma ferramenta essencial para empresas que buscam mitigar riscos associados a inadimplência de clientes. Através dessa parceria, segundo essa reportagem, “as partes envolvidas nesta negociação pretendem proporcionar aos seus clientes uma cobertura robusta que assegure o recebimento de créditos em aberto, independentemente das condições econômicas”[4].
Essa atitude é particularmente importante em tempos de instabilidade econômica, onde o risco de inadimplência aumenta. Com a proteção de crédito, as empresas podem continuar operando com mais confiança, sabendo que seus fluxos de caixa estão protegidos contra possíveis falências ou atrasos significativos de pagamento por parte dos seus clientes, tais como fatos ocorridos com o advento da pandemia e, mais recentemente, com as enchentes que assolaram nosso Rio Grande do Sul.
Os riscos climáticos têm se tornado uma preocupação crescente para as empresas em todo o mundo. Eventos climáticos extremos, como tempestades, inundações e secas, podem causar danos significativos a ativos físicos, interromper cadeias de suprimentos e afetar a continuidade dos negócios.
Assim, o cenário digital atual, inclusive com um desenho que poderia ser melhor esboçado no projeto da Reforma de nosso Código Civil no que diz respeito ao contrato de seguro, tais como riscos cibernéticos que constituem uma das principais preocupações para as empresas. Ataques de hackers, violações de dados e interrupções de sistemas podem causar prejuízos financeiros significativos, além de danos à reputação das empresas.
A colaboração entre empresas representa um passo importante na oferta de soluções integradas de gerenciamento de riscos no Brasil. Em um ambiente de negócios cada vez mais desafiador, essa parceria oferece uma camada adicional de segurança, permitindo que as empresas se concentrem em seu crescimento e inovação com a tranquilidade de estarem protegidas contra muitos imprevistos indesejáveis.
Impende sublinhar que consta no sobredito artigo o que disse o jurista italiano Stefano Rodotà , transcrito por seus autores, de que "diante do fluir da história, da perene mutação das coisas que ela produz, o problema do direito está sempre na pretensão de enclausurar esse movimento em um átimo determinado, dando-lhe ares de modelo e regra".[5] Com efeito, na finalização do tema por eles eleito, “asseveraram que se o direito tiver a pretensão de esgotar as possibilidades de regulação de matérias relativas à inovação tecnológica, lançando-se como instrumento absoluto e suficiente para o seu controle, rapidamente restará esvaziado. Tentar prever todas as hipóteses de sua incidência seria não apenas prepotente, mas também ingênuo”.[6]
Não é sem tempo que se poderá acoimar a reforma do Código Civil no que tange aos tempos digitais, fruto de uma legislação moderna jungida ao contrato de seguro com implementos estruturais de uma solução integrada, que seja mais arrojada e segura, já que este último instituto criado em priscas eras deverá sempre continuar e perdurar no decurso do tempo, com roupagens que se adequem aos novos tempos, objetivando cada vez mais fortalecer sua imagem de proteção aos bens e aos homens.
Porto Alegre, 12 de junho de 2024
Voltaire Marenzi - Advogado e Professor
[1] https://www.migalhas.com.br/coluna/reforma-do-codigo-civil/408969/a-desindexacao-na-reforma-do-codigo-civil.
[2] Bis in idem.
[3] Informações colhidas no Google.
[4] Ibidem.
[5] Artigo citado no preâmbulo deste ensaio.
[6] Idem.
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