A MP 966. A Responsabilização do Agente Público
Com a edição no dia 13 de maio de 2020, da Medida Provisória 966 que trata da responsabilidade dos agentes públicos nas esferas civil e administrativa, quando estes agirem ou se omitirem com dolo ou erro grosseiro nas práticas de atos relacionados à pandemia decorrentes da Covid-19, (artigo 1º) se traz, em um primeiro momento, reflexões de cunho legal relativas ao conteúdo e a interpretação do sobredito texto recentemente editado.
O Regulamento da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), introduzidas pelo Decreto nº 9.830, de 10 de junho de 2019, cuida, no artigo 12 da matéria, ao dispor:
“ O agente público somente poderá ser responsabilizado por suas decisões ou opiniões técnicas se agir ou se omitir com dolo, direto ou eventual, ou cometer erro grosseiro, no desempenho de suas funções”.
Este artigo acima transcrito, que atualmente é previsto como Lei de Introdução ao Código Civil, é reproduzido praticamente em seu todo pelo artigo 1º da MP 966/20 que fala em dolo, sem especificar se ele é direto, acidental ou eventual – este último de natureza penal -, bem como da inserção de erro grosseiro considerado como defeito do negócio jurídico no Código Civil levando à situação alvitrada pela legislação civilista à anulabilidade do ato. O nosso diploma material não fala em erro grosseiro, mas em erro substancial, rectius, artigo 139 do Código Civil, dentro do Capítulo IV, do Título I, do Negócio Jurídico.
Já o dolo direto é considerado pela doutrina, tanto penal como civil como todo o ato praticado pela parte com a finalidade deliberada e consciente de causar lesão ao ofendido.
No Código Civil se rotula de dolo acidental quando, a seu despeito, o negócio seria realizado, embora por outro modo. (Art. 146 CC).
O dolo eventual em sede de direito penal ocorre quando o sujeito ativo assume, deliberadamente, o risco de produzir um resultado danoso ao terceiro. É a hipótese, por exemplo, de um caçador que vendo que seu companheiro não está mais a seu lado “atira” em um vulto que surge em seu derredor sem saber do que, efetivamente, se trata, assumindo, portanto, por este ato o risco de atingir seu parceiro de caçada.
Retornando a MP 966/20 os agentes públicos se definem como pessoas físicas que prestam serviços ao Estado, de uma forma remunerada ou não, sob modalidade política ou administrativa.
Eles, agentes públicos, terão suas responsabilidades civis ou administrativas apuradas na forma alhures prevista, quer no enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente da pandemia dacovid-19, (inciso I, do artigo 1º), ou no combate aos feitos econômicos e sociais decorrentes da pandemia dacovid-19, (inciso II, do artigo 1º).
Os preceitos da Responsabilidade Civil encontram-se plasmados nos artigos 927 a 943 do nosso Código Civil, malgrado o instituto do Seguro de Responsabilidade Civil tenha sido contemplado apenas em um único dispositivo na atual legislação material, vale dizer, artigo 787 do CC.
O § 1º, do artigo 1º da MP/966, reproduz o que se encontra estampado no § 6º, do artigo 12 da LINDB, ou seja, de que a responsabilização pela opinião técnica não se estenderá de forma automática ao decisor que a houver adotado como fundamento de decidir e, somente, se configurará se estiverem presentes elementos suficientes para o decisor aferir o dolo, ou o erro grosseiro oriundo de opinião técnica, ou se houver também conluio entre os agentes.
Convido, outrossim, aos nossos leitores e leitoras que façam o devido cotejo analítico com o que se disse percorrendo o que está dito nos incisos I e II do § 1º, do artigo 1º da sobredita MP 966/2020.
De outro giro, o § 2º do artigo 1º e o artigo 2º da MP em pauta também encontram abrigo e guarida no § 3º e no § 1º da LINDB, que enfatizam que o mero nexo de causalidade entre a conduta e o resultado danoso, não implicam responsabilização do agente público e que o erro grosseiro é manifestado de um modo evidente e inescusável, desde que praticado com culpa grave caracterizado por ação ou omissão a par de elevado grau de negligência, imprudência ou imperícia.
No artigo 3º da MP 966/20 se cuidou da aferição da ocorrência do erro grosseiro, tais como obstáculos, dificuldades, complexidade da matéria, circunstâncias de informações, assim como do contexto de incertezas das medidas adequadas para o enfrentamento da pandemia decorrente dacovid-19, inclusive de natureza econômica. Enfim, cuida-se de uma verdadeira análise resultado de uma casuística nos termos do que se acha inserto no artigo 13 da LINDB.
O último artigo da MP, vale dizer, o 4º, cuida da vigência da lei que no caso se deu a partir da data de sua publicação, ou seja, atualmente com plena eficácia ocorrida na madrugada de 14/05/2020.
Porto Alegre, 19/05/2020.
Voltaire Marensi - Advogado e Professor
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