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TOKIO MARINE SEGURADORA

Da prova do contrato e sua interpretação (Destaque)

  • Crédito de Imagens:Divulgação - Escrito ou enviado por  Voltaire Marenzi - Advogado e Professor
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Voltaire Marenzi - Advogado e Professor Voltaire Marenzi - Advogado e Professor

Vou iniciar os comentários da Seção IX, da Nova Lei de Seguros, que trata da prova do contrato, retratada em uma síntese lapidar de autoria de Moacyr Amaral Santos, que, entre inúmeras titulações, exerceu o cargo de ministro do Supremo Tribunal Federal e de Professor Catedrático da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

“Provar é convencer o espírito da verdade respeitante a alguma coisa”,[1] escreveu o mestre.

“O contrato de seguro prova-se por todos os meios admitidos em direito, vedada a prova exclusivamente testemunhal”.[2]

Também de, modo escorreito e objetivo, escreveu Araken de Assis, exímio processualista e renomado jurista gaúcho, ao dizer:

“A prova testemunhal é prova constituenda”.[3]

Esse tipo de prova é, a meu sentir, extremamente importante porque uma prova constituenda depende de atos futuros para se materializar, enquanto a prova constituída já foi formada e pode ser analisada no julgamento de um determinado processo.

Ademais calha à fiveleta a frase “a prova nasce com o processo e a testemunhal com o processo” atribuída ao jurista espanhol Santiago Sentís Melendo. Embora, segundo a literatura jurídica, não tenha sido possível identificar uma obra específica que contenha essa citação exata, seus estudos influenciaram diversas obras jurídicas correlatas ao tema da prova.

Pois bem. Neste sentido se prossegue com a dicção do artigo 55 da Lei, ora sob exame, que dita:

“A seguradora é obrigada a entregar ao contratante, no prazo de até 30 (trinta) dias, contado da aceitação, documento probatório do contrato, do qual constarão os seguintes elementos:

  • A denominação, a qualificação completa e o número de registro da seguradora no órgão fiscalizador de seguros;
  • o nome do segurado, e caso distinto, o do beneficiário, se nomeado;
  • o nome do estipulante;
  • o dia e o horário do início e fim de vigência do contrato, bem como o modo de sua determinação;
  • o valor do seguro e a demonstração da regra de atualização monetária;
  • os interesses e os riscos garantidos;
  • os locais de risco compreendidos pela garantia;
  • os interesses, os prejuízos e os riscos excluídos;
  • o nome, a qualificação e o domicílio do corretor de seguro que intermediou a contratação do seguro;
  • em caso de cosseguro organizado em apólice única, a denominação, a qualificação completa, o número de registro no órgão fiscalizador de seguros e a cota de garantia de cada cosseguradora, bem como a identificação da cosseguradora líder, de forma destacada;
  • se existir, o número de registro do produto no órgão fiscalizador competente;
  • o valor, o parcelamento e a composição do prêmio”.

Todos estes documentos supra elencados são probatórios do contrato de seguro, significa dizer, instrumentos formais que comprovam a existência, a validade e os termos do acordo entre segurado e a seguradora. Tais documentos são essenciais tanto para a constituição do contrato quanto para a eventual análise de sinistros.

Enfim, os documentos acima arrolados, em seu todo, constituem em seu conjunto probatório um meio robusto para garantir a segurança jurídica do contrato de seguro, protegendo os interesses das partes e orientando uma comprovada eficiência na regulação de eventuais sinistros em razão do interesse acobertado pelo segurador.

Não cabe comentar, aqui, item por item deste rol, por ser por si só autoexplicativo os quais pretendo explicitar, de modo mais minudente, no decurso dos comentários sobre a novel lei de seguros.

O §1º deste artigo determina que a quantia segurada será expressa em moeda nacional, observadas as exceções legais.

De acordo com o artigo 133 da nova lei que passará a viger no tempo apontado alhures, reproduzido em comentários anteriores, posto que os artigos 9º a 14 do Decreto-Lei nº 73, de 21 de novembro de 1966, serão revogados, quando da vigência da nova lei, muito embora a quantia segurada a par de outras leis complementares já exigissem que essa deveria ser expressa em moeda nacional. Entretanto, a nova lei é mais detalhada e minudente na redação deste parágrafo em comento, assegurando, de modo transparente, a estabilidade econômica evitando flutuações causadas por variações cambiais em contratos firmados no território brasileiro. Todavia, em sua parte final, é determinado que a quantia segurada poderá ser expressa em moeda estrangeira, assegurando uma maior flexibilidade para contratos específicos que envolvam operações internacionais ou através de setores especializados.

Por fim o §2º, que encerra esta seção, afirma que a apólice conterá glossário dos termos técnicos nela empregados.

A exigência de inclusão de um glossário dos termos técnicos em apólices de seguro é uma prática determinada pela legislação e setor deste mercado, especialmente para assegurar transparência e compreensão por parte do segurado. Essa obrigação se encontra totalmente alinhada com o princípio da boa-fé objetiva, que rege os contratos de seguro e é reforçada por normas do órgão fiscalizador, vale dizer, a SUSEP.

A abordagem da nova lei sobre a prova do contrato de seguro reflete uma evolução normativa que busca equilibrar os interesses das seguradoras e dos consumidores, promovendo um ambiente de negócios mais seguro e confiável.

De outro giro, a interpretação do contrato está inserta na Seção X da nova Lei.

Ela, interpretação, analisa e esclarece o sentido e o alcance das cláusulas e disposições contidas nesse tipo de contrato, com o objetivo de determinar as obrigações e o direito das partes envolvidas, vale dizer, o segurado, ou seu representante e a seguradora. Essa interpretação é necessária para resolver dúvidas, conflitos ou ambiguidades que possam surgir na aplicação do contrato, especialmente em situações de sinistro ou litígio.

Como doutrinou o imorredouro jurisconsulto, Pontes de Miranda, a interpretação serve “para resolver questões que os figurantes não previram. Quando dois ou mais figurantes acordam no que concerne ao conteúdo do negócio jurídico bilateral ou plurilateral, não só assentaram sobre aqueles pontos que explicitamente foram referidos; o fim objetivo ilumina pontos sobre os quais os figurantes não dirigiram a sua lanterna. No negócio jurídico regula-se tudo que era indispensável que se regulasse. Interpretou-se o negócio jurídico e, apanhando-se-lhe o sentido, faz-se aparecer como se tivessem sido previstas soluções de problemas que se tinham de resolver conforme o sentido mesmo do negócio jurídico”.[4]

Acentua o artigo 56 da nova lei:

“O contrato de seguro deve ser interpretado e executado segundo a boa-fé”.

Discorrendo sobre este princípio, básico e fundamental no seguro, da uberrima et bona fides – abundante e de boa-fé -, escreveu Emílio Betti, Professor Catedrático de la Universidadad de Roma:

La buena fe contractual, consiste, no ya en um estado de ignorância, sino en uma actitud de activa cooperación que llleva a cumplir la expectativa ajena, com uma conducta positiva própria, la cual se desarrolla em favor de um interesse ajeno”.[5]

Uma feliz definição quanto à aplicabilidade deste princípio se colhe nos ensinamentos do saudoso amigo e Professor Clóvis do Couto e Silva, Paraninfo de nossa Turma da UFRGS em 1970, um dos integrante do rol de colaboradores do atual Código Civil, quando lançou a seguinte asserção:

“A aplicação do princípio da boa-fé tem, porém, função harmonizadora, conciliando o rigorismo lógico-dedutivo da ciência do direito do século passado com a vida e as exigências éticas atuais, abrindo, por assim dizer, no hortus conclusos do sistema do positivismo jurídico, ‘janelas para o ético’ (Esser Grundsataz u Norm).[6]

De outro giro, diz o artigo 57 da nova lei:

“Se da interpretação de quaisquer documentos elaborados pela seguradora, tais como peças publicitárias, impressos, instrumentos contratuais ou pré-contratuais, resultarem dúvidas, contradições, obscuridade ou equivocidade, elas serão resolvidas no sentido mais favorável ao segurado, ao beneficiário ou a terceiro prejudicado.”

A propósito Rubén S. Stiglitz, um dos mais entusiastas e colaboradores desta nova lei, acentuou:

Zavala Rodríguez y Hapenrin lideran la tesis contraria a la de Castillo.

Criticamos también – la extensión de los formulários actuales, la minucia de muchos detalles, como también la letra menuda. Es difícil – concluye – que el simples particular o el hombre de campo lea o capte el alcance de clásulas de pólizas escritas com gran extensión y em caracteres tipográficos casi ilegibles.

Por su parte Halperin: El segurador entregará al tomador un instrumento debidamente firmado, que sea fácil y claramente legible”.[7]

Em síntese, aplicar-se-á o que diz o §3º do artigo 54 do nosso CDC.[8]

Giza, de outra feita, o artigo 58 da nova lei:

“As condições particulares do seguro prevalecem sobre as especiais, e estas, sobre as gerais”.

A lógica dessa prevalência está no princípio de que as condições mais específicas representam uma manifestação mais clara e individual da vontade das partes, enquanto as condições gerais servem como base ou pano de fundo. Neste diapasão, as condições gerais e especiais são aplicadas de forma subsidiária às condições particulares, exceto quando estas forem contrárias à ordem pública ou normas imperativas.

Por fim, o artigo 59 desta Seção dispõe:

“As cláusulas referentes a exclusão de riscos e prejuízos ou que impliquem limitação ou perda de direitos e garantias são de interpretação restritiva quanto à sua incidência e abrangência, cabendo à seguradora a prova do seu suporte fático”.

Em verdade, no contexto dos contratos de seguro, as cláusulas que tratam da exclusão de riscos e prejuízos ou que estabelecem limitação ou perda de direitos e garantias estão sujeitas a uma interpretação restritiva. Isso significa que tais cláusulas devem ser interpretadas de maneira rigorosa e limitada, de modo a evitar prejuízos indevidos ao segurado. Portanto, cabe à seguradora demonstrar que os fatos que levaram à negativa de cobertura estão expressamente previstos em clausulados restritivos ou de exclusão de cobertura em tais hipóteses, ali consignadas. Caso a seguradora não consiga cumprir esses requisitos, a interpretação favorece o segurado, e a cobertura pode ser garantida. Essa abordagem busca equilibrar a relação contratual, garantindo a proteção do segurado contra abusos ou ambiguidades contratuais.

Em análise apertada; interpretar o contrato de seguro é um processo indispensável para garantir que ele cumpra seu objetivo essencial, oferecendo proteção financeira ao segurado dentro dos limites contratados, inserto em um instrumento – apólice de seguro -, cognominado também, na atualidade, como típico contrato relacional.

Porto Alegre, 19 de janeiro de 2025

Voltaire Marenzi - Advogado e Professor

[1] Primeiras Linhas de Direito Processual Civil, volume 2, página 371. Editora Saraiva, 26ª edição, 2010.

[2] Art. 54 da nova lei de seguro. Lei nº 15.040, de 9 de dezembro de 2024.

[3] Processo Civil Brasileiro, volume III, página 820. Editora Revista dos Tribunais, 2015.

[4] Tratado de Direito Privado, volume 38, página, 71. Editor Borsoi. Rio de Janeiro, 1.962.

[5] Teoria General de Las Obligaciones. Tomo I, página 77. Editorial. Revista de Derecho Privado. Madrid.

[6] Obrigação Como Processo, 1.964. Apud Voltaire Marensi. O Seguro no Direito Brasileiro, 9ª edição, página 49.

[7] Derecho De Seguros. Tomo I, 4.TA Edicion. La Ley, 2005, página 671.

[8] Código de Defesa do Consumidor. Lei 8.078/1.990


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