A importância da otimização perioperatória no pós-Covid-19
Por Luiz Fernando dos Reis Falcão e Marcelo Ribeiro de Magalhães Queiroz *
Em meio à pandemia do novo Coronavírus, é importante destacar os desafios enfrentados pelo sistema de saúde, e entre uma de suas soluções está a otimização perioperatória, ou seja, de protocolos assistenciais multidisciplinares baseados em evidências científicas, com treinamento da equipe, para reduzir a variabilidade da assistência (antes, durante e pós) e melhorar os desfechos cirúrgicos.
Recente análise demonstrou que a otimização perioperatória, aplicada em cirurgias de grande porte, reduziu o tempo de recuperação e internação hospitalar em 2 a 3 dias e complicações em 30 a 50%.
A base filosófica dessa metodologia é a percepção de que o cuidado ao paciente cirúrgico, tradicionalmente, funciona de forma desconexa e independente, não havendo interação e comunicação entre os diversos setores envolvidos, bem como entre o período antes, durante e pós-operatório. Esse modelo deve ser quebrado para garantir um atendimento linear e contínuo, otimizando o cuidado ao paciente durante a sua jornada perioperatória.
Anestesistas, cirurgiões, intensivistas, enfermeiros, nutricionistas, fisioterapeutas etc. precisam estar unidos para formar um time local que garanta o funcionamento de um tratamento linear.
Revisando os mecanismos fisiológicos por trás da eficácia da otimização perioperatória, a principal proposta que tem se mostrado benéfica é a manutenção da homeostasia através do controle do metabolismo, além do suporte para o completo retorno das principais funções basais. Na prática, o retorno da função do intestino, alívio da dor com analgésicos, mobilização para os níveis pré-operatórios e ausência de complicações que necessitam cuidados hospitalares podem servir como critérios clínicos para alta hospitalar.
Dessa forma, a metodologia preconiza a realização de medidas pré-admissionais, pré-operatórias, intraoperatórias e pós-operatórias com o objetivo de reduzir o estresse metabólico e manter a homeostase.
O Covid-19, presente na nossa população há meses, trouxe impactos negativos na economia do Brasil, incluindo o colapso no sistema de atendimento à saúde. A situação que vivenciamos não encontra paralelo na história moderna e, portanto, não há informações disponíveis para comparar e projetar o efeito da interrupção das cirurgias eletivas na saúde pública.
Mas a retomada das cirurgias eletivas exige participação efetiva dos serviços de anestesia junto ao comitê gestor da crise, que terá que desenvolver protocolos para possibilitar o retorno com segurança.
Os protocolos de otimização perioperatória são medidas que permitem melhor eficiência operacional dos leitos hospitalares, além de trazer qualidade e segurança a assistência dos pacientes, permitindo que estes fiquem o menor tempo possível no hospital.
Infelizmente, não há dados concretos sobre o impacto que o represamento de cirurgias eletivas terá no agravamento da condição clínica do paciente, na sua saúde e bem-estar. Porém, é intuitivo e provável que pacientes com condições mais complexas, e que não puderam realizar procedimentos terapêuticos, tenham tido prejuízos em termos de prognóstico; outros tantos podem ter tido atraso em seus diagnósticos.
Também há o impacto econômico, em específico na rede privada, onde os hospitais acabaram por ter suas receitas reduzidas enquanto se dedicavam a atender os pacientes infectados pelo Covid-19.
No Brasil, a crise já dura seis meses e deve se prolongar, o que faz supor que a situação possa ser ainda pior e que os hospitais sofrerão fortes impactos econômicos. Diante disso, cabe aos hospitais e suas equipes gerarem estratégias seguras e efetivas de retomada dos procedimentos cirúrgicos para a população.
Através de três pilares, o serviço de anestesia tem papel fundamental para maximizar os resultados hospitalares na transição para o cenário pós-Covid: (1) centralizando a responsabilidade, (2) melhorando a qualidade e (3) desenvolvendo protocolos para padronizar condutas e reduzir variabilidade na assistência.
A centralização da responsabilidade ocorrerá devido ao fato de o anestesista permanecer no hospital durante todo o perioperatório. O anestesista poderá otimizar o paciente no pré-operatório, conduzir as condutas padronizadas no intraoperatório e contribuir na integração dos setores para o adequado pós-operatório.
A melhoria da qualidade ocorrerá através da participação e implantação de melhorias nos processos, performance e desfechos, focados na experiência do paciente. Adicionalmente, poderá contribuir na medição e mensuração para gerar estratégias de melhoria.
Por fim, o desenvolvimento dos protocolos padronizados permitirá reduzir a variabilidade da assistência com o objetivo de reduzir as complicações perioperatórias. Estes protocolos são fundamentados na medicina baseada em evidências, com foco na qualidade e segurança dos pacientes.
* Dr. Luiz Fernando dos Reis Falcão é anestesiologista na Rede de Hospitais São Camilo de São Paulo e diretor de Operações no Grupo de Anestesiologistas Associados Paulista (GAAP).
* Dr. Marcelo Ribeiro de Magalhães Queiroz é anestesiologista na Rede de Hospitais São
Camilo de São Paulo e diretor Executivo no Instituto Paulista de Assistência Respiratória (IPAR).
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