Câncer e doenças reumáticas: uma conexão perigosa
A Sociedade Paulista de Reumatologia alerta para importantes descobertas sobre a conexão do câncer e das doenças reumáticas, que atingem 15 milhões de brasileiros
As doenças reumatológicas, de maneira geral divididas entre as manifestações autoimunes e as doenças degenerativas, possuem grande correlação com o câncer e os médicos precisam estar atentos para essa conexão para garantir a segurança de seus pacientes e escolher o melhor tratamento para garantir qualidade de vida.
Segundo a diretora da Sociedade Paulista de Reumatologia e professora do HC-FMUSP, a reumatologista, Danieli Andrade, as doenças reumáticas, que são inflamatórias e crônicas, trazem situações predisponentes ao desenvolvimento do câncer especialmente pelos tratamentos utilizados com imunossupressores, que afetam a imunidade do paciente.
“Sabemos que as doenças reumáticas, que usam esses remédios, predispõem os pacientes a terem infecções, inclusive infecções crônicas como é o exemplo do HPV, que pode levar ao desenvolvimento de câncer de colo do útero”, alerta a reumatologista.
Doença autoimune pode levar ao câncer e vice-versa
“Uma das situações que o reumatologista tem que estar muito atento é quando você percebe que o indivíduo está abrindo um quadro de doença numa época atípica. Então imagine que as nossas doenças reumatológicas, autoimunes de uma maneira geral, são doenças de mulheres jovens. Se por um acaso, nós avaliamos um paciente, um idoso, que abre um quadro de artrite reumatóide aos 70 anos, apesar de que isso pode acontecer mesmo sendo uma situação de maior exceção, nós temos que ter o raciocínio e levantar a possibilidade de pensar que aquilo pode ser uma manifestação chamada paraneoplásica. E o que que é isso? A pessoa tem um câncer escondido, mas na verdade, ela está manifestando aquilo de uma forma sistêmica como uma doença autoimune reumatológica. Então isso é uma das situações”, explica a médica.
Outra das situações que pode acontecer é exatamente o raciocínio inverso. “Então imagina que o oncologista que está tratando uma mulher com câncer de mama e resolveu usar uma terapia para câncer, principalmente os cânceres que expressam o hormônio, e esse tratamento pode levar a dores incapacitantes articulares nessa mulher. Portanto, é muito importante a parceria entre o oncologista e reumatologista para que se tenha um resultado final melhor em termos de tratar o paciente da doença de base que ele tem, nesse caso o câncer, mas também dar a oportunidade de a pessoa viver com uma qualidade de vida melhor”, avalia a reumatologista.
E uma terceira situação, citada pela médica da conexão entre câncer e doença reumática, refere-se ao tratamento da imunoterapia, um tratamento muito recente que trata cânceres agressivos que geralmente não são responsivos às terapias habituais.
A reumatologista cita exemplo de um paciente que se trata com imunoterapia para câncer de pulmão e o sistema imune pode receber uma mensagem de atacar demais aquele tumor e, na verdade, levar o paciente a desenvolver uma doença autoimune. “Nós temos visto isso e eu de novo aqui trago essa questão muito importante de que o oncologista precisa encaminhar esse paciente precocemente para o reumatologista porque eu já vi paciente dizer: “doutora, eu prefiro viver um ano a menos mas viver com qualidade de vida”, então a gente precisa ver sim o paciente como um todo”, alerta.
Como o paciente reumático pode evitar o câncer?
O importante é que o reumatologista avalie caso a caso de maneira individualizada. Para Danieli Andrade, não há como generalizar porque é preciso enxergar tanto a doença reumatológica como o câncer de maneira individualizada, pois a mesma doença, o lúpus, por exemplo, pode se manifestar de forma agressiva em um paciente com sequelas irreversíveis e, em outro, manifestar-se com quase nenhuma perda de qualidade de vida.
A diretora da SPR recomenda que o paciente faça acompanhamento regular com o reumatologista assim como deve fazer todas as medidas de “screening” que o próprio médico reumatologista deve prescrever como mamografia e colonoscopia. “Tudo de maneira orientada pelo médico, que acompanha esse paciente, não de uma forma indiscriminada”, destaca.
Andrade acredita ser fundamental uma conversa muito bem ponderada entre o reumatologista e o oncologista para que não trate demais a doença reumatológica e descompense o câncer, e nem o contrário: não se trate de menos a doença reumatológica privilegiando demais o câncer a ponto de que a pessoa tenha uma qualidade de vida miserável. Então isso é uma sintonia fina entre os dois especialistas, inclusive com a opinião compartilhada do paciente, que hoje cada vez é mais importante nessas situações em que os médicos não têm respostas absolutas para tudo”, orienta.
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