Novo Ensino Médio: a necessidade de oferecer aos estudantes uma educação mais interdisciplinar
Por Leticia Lyle, Diretora da Camino School e cofundadora da Camino Education e da Cloe
Desde que comecei minha trajetória como pedagoga e educadora, sempre me atentei à importância da interdisciplinaridade. Acredito que o conhecimento e a aprendizagem quando são vistos de forma independente, sem um diálogo com a vida real, temos um formato que em breve cairá em declínio. A ideia de conteúdos não interligados com a realidade deveria ser vista com cautela, assim como o conceito de professor como o detentor do saber.
Iniciado em 2022, o novo Ensino Médio propõe uma aprendizagem por áreas de conhecimento, permitindo ao jovem, inclusive, optar por uma formação técnica e profissionalizante. Ao final dessa nova jornada, o estudante deverá sair muito diferente de como entrou, com uma visão mais abrangente das disciplinas às quais esteve imerso, fazendo um grande diálogo entre o desenvolvimento de competências e habilidades acadêmicas e o mercado de trabalho, que não são excludentes entre si.
O currículo, se organizado por áreas de conhecimento e não por disciplinas como ocorria antes, coloca o estudante como central no processo de aprendizagem, algo que sempre defendi como educadora. Na nova estrutura, até 1.800 horas contemplam habilidades e competências relacionadas às quatro áreas do conhecimento, como é feito no Enem -- Matemática e suas Tecnologias; Linguagens e suas Tecnologias; Ciências da Natureza e suas Tecnologias; Ciências Humanas e Sociais Aplicadas. Para além disso, no mínimo 1.200 horas devem estar reservadas para a Formação Técnica e Profissional.
Ou seja, a matemática deixa de ser apenas o cálculo em si e pode navegar por outras águas, até mesmo pela história e geografia. A língua portuguesa e outros idiomas podem ser um meio para se aprender ciências biológicas e vice-versa. O algoritmo das exatas passa a ter uma conexão direta com as ciências sociais na medida em que fazemos conexões entre o conteúdo trabalhado em sala de aula e a sociedade na qual vivemos. A química e a biologia, associadas com os estudos das atualidades, serão mais úteis para entendermos o que vivemos durante a pandemia – e o que fazer para não repetir algo semelhante. Isto é, jovens terão a oportunidade de ser expostos a uma infinidade de conhecimentos apresentados de modo articulado. Uma grande responsabilidade e um grande desafio.
Da posição de educadora e gestora, vejo que entre 2020 e 2021, com a crise sanitária global causada pela Covid-19, paradigmas entraram em colapso.
A Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (Pnad) mostrou que garantir que os jovens brasileiros permaneçam na escola nos anos finais do Ensino Médio é o principal desafio para que o Brasil consiga universalizar o acesso à educação básica. A versão mais recente do levantamento indica que, no terceiro trimestre de 2021, 4,4% dos jovens na faixa etária dos 15 a 17 anos estavam fora da escola – isto é, o equivalente a 407,4 mil pessoas. É diante desse cenário que surge a proposta de tirar de cena um modelo único e carregado de disciplinas obrigatórias para implementar um modelo de ensino mais flexível.
Já nesta nova realidade, uma parte do currículo (40%) é composta pelos chamados Itinerários Formativos. É aqui que entra a flexibilidade: trata-se de uma formação à parte que o estudante escolherá a partir de suas preferências e intenções de carreira. Essas jornadas também variam conforme as possibilidades de oferta das redes de ensino e escolas.
De acordo com os “referenciais para elaboração dos itinerários formativos”, documento publicado pelo Ministério da Educação, essa metodologia se organiza a partir de quatro eixos estruturantes, que devem ser complementares. Esse “quadripé” – investigação científica, processos criativos, mediação e intervenção Sociocultural, empreendedorismo – compõe pilares edificantes, não apenas para o processo de aprendizagem individual, mas também para a formação coletiva de uma sociedade mais ativa, autônoma e protagonista.
A educação, assim como a língua, é viva, complexa e pulsa rumo ao futuro. É preciso estar em constante adaptação, em consonância com a sociedade e suas respectivas agendas. Olhar à frente requer um novo olhar.
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