Envelhecimento da população põe em xeque reforma da previdência
Para o especialista Hélio Zylberstajn, proposta do governo reduz gastos, mas não resolve o problema de financiamento das aposentadorias.
“Apenas um primeiro passo”. Assim Hélio Zylberstajn, especialista em relações do trabalho e professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo (FEA-USP), se refere à Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 287. “Trata-se de uma reforma meia-sola, que muda, basicamente, a idade mínima de aposentadoria. A população está envelhecendo rapidamente e se nada mudar, em 20 anos não haverá recursos para pagar as aposentadorias”, disse ele durante participação no evento “A reforma da Previdência Social à luz da experiência internacional”, promovido pela Escola Nacional de Seguros, dia 27 de abril, em São Paulo.
A opção do governo por uma proposta de reforma paramétrica, e não estrutural, manteve o regime repartição, em que os benefícios dos trabalhadores inativos são financiados pelos trabalhadores em atividade. Mas, Zylberstajn acredita que esse modelo está condenado à falência na medida em que o Brasil está envelhecendo. "A taxa de crescimento demográfico está diminuindo. Temos uma inversão da equação e não haverá número suficiente de jovens para pagar aposentadorias no futuro", argumenta o professor.
Zylberstajn também classifica a reforma de tímida, por não alterar em nada o financiamento da Previdência Social e tampouco as alíquotas que incidem sobre a folha de pagamento. Daí porque entende que a proposta do governo não conseguirá trazer equilíbrio ao sistema. Ele ressalta que pesam sobre os custos do INSS os inúmeros mecanismos de proteção ao emprego, como o seguro desemprego, o FGTS, a multa sobre FGTS, aviso prévio, abono salarial etc. “Entretanto, a taxa de rotatividade é alta. Então, será que protegemos ou incentivamos?”.
Para o especialista, o governo cometeu um erro ao acreditar que a população estava convencida da necessidade da reforma. “Mas, o fatos mostraram que isso está muito longe de acontecer”, disse. Depois de protestos de grupos organizados, a segunda versão da PEC 287 excluiu 86% dos servidores públicos, justamente o segmento que responde pela maior parte dos gastos da previdência.
Em números de 2015 contabilizados por Zylberstajn, apenas 2% dos beneficiários do INSS receberam acima de 5 salários mínimos contra 79% do funcionalismo público. Em valores, significa que o INSS gastou naquele ano R$ 418,5 bilhões com os 33 milhões de assistidos contra R$ 255,7 bilhões com apenas 3,6 milhões de servidores. “Uma distorção”, segundo ele.
Uma nova previdência
Zylberstajn apresentou uma proposta de reforma da previdência, desenvolvida pela Fipe e apoiada pelo setor de seguros, que abrange apenas os trabalhadores nascidos a partir de 2.000. As regras básicas são a taxa de reposição próxima de 100% para a base da pirâmide; a idade mínima de 65 anos para homens e mulheres; e o tempo de contribuição de 40 anos para homens e 35 anos para mulheres.
O novo modelo, um sistema multipilar, um deles capitalizado, que utiliza o FGTS e reduz toda a carga tributária sobre a folha de pagamento, é uma ideia que Zylberstajn classifica de vencedora. A proposta chegou a ser apresentada como emenda à PEC 287, por iniciativa do Movimento Brasil Livre (MBL), foi debatida, mas não aprovada. Entretanto, ele acredita ainda haverá espaço para esse novo modelo no futuro. “Essa reforma é apenas o começo e esse tema voltará à discussão”, disse.
Debatedor no evento, o presidente da Federação Nacional de Previdência e Vida (FenaPrevi), Edson Franco, reiterou o apoio do setor de seguros à proposta da Fipe, destacando as oportunidades do Pilar 3, que possibilita a destinação de parte dos recursos à compra de cobertura de riscos (morte e invalidez) junto à iniciativa privada.
“Hoje, vemos o Estado funcionando como grande provedor de coberturas de riscos, mas sem nenhum tipo de provisionamento. Por que o Estado tem de assumir esse papel, quando a iniciativa privada pode fornecer esse produto?”, disse Franco. Da mesma forma, a contratação de rendas vitalícias, as annuities, também poderá ser realizada por meio de licitação na iniciativa privada, a exemplo do que ocorre no Chile.
Modelos de outros países
Gustavo Bonomi Silvestre, da Swiss Re, trouxe ao evento exemplos de sistemas previdenciários de outros países. A França, por exemplo, adota o sistema de repartição, com contribuições compulsórias de empregados (6,75% do salário) e empregadores (8,4%). Os trabalhadores também são obrigados a aderir a um sistema de complementar. A idade mínima para a aposentaria é de 62 anos e para o benefício integral de 67 anos, que corresponde a 70% do salário.
Na Alemanha o regime também é de repartição, com contribuições de empregados e empregados em partes iguais, equivalentes 18,7% do salário bruto. Em 2007, o governo alemão estabeleceu um aumento gradual da idade mínima, que em 2029 passará a ser de 67 anos. Mas, em 2014, outra reforma permitiu a aposentadoria aos 63 anos para trabalhadores que contribuíram por pelo menos 45 anos.
Na Grécia, o regime é de repartição. Em 2012, a idade passou a ser de 67 anos, com contribuição mínima de 40 anos para benefício integral. Já na Suécia, duas reformas em 1994 e 1998 introduziram as contas nocionais para os trabalhadores. “São como contas de contribuição definida, em que o saldo é controlado de forma virtual. É semelhante à capitalização, em que cada um tem sua própria conta”, explicou.
No Japão, o sistema previdenciário é dividido entre a pensão básica, para a qual todos os maiores de 20 anos devem contribuir, e o seguro de pensão, com contribuições dos trabalhadores de 8,5% do salário. Para receber pensão básica é preciso ter no mínimo 65 anos de idade e 25 anos de contribuição. Já para a pensão dos empregados, é preciso ter pelo menos 60 anos e 25 anos de contribuição. Recebem pensão integral apenas os que contribuíram por no mínimo 40 anos.
No Chile, o sistema de previdência social obriga os trabalhadores a reservarem 10% de sua renda mensal para a aposentadoria, cujos recursos são gerenciados por administradoras de fundos de pensões (AFP). Na reforma de 2008, foi constituída a garantia de pagamento de uma pensão assistencial para aqueles setores da população não cobertos pelos programas de capitalização individual. As mulheres começam a receber o benefício aos 60 anos e os homens aos 65 anos.
No final do evento, o debatedor Silas Kasahaya, presidente do CVG-SP, destacou as oportunidades para a indústria de seguros com a mudança do sistema previdenciário. “Discutimos aqui os problemas que o governo tem de administrar, mas o nosso mercado de seguros pode oferecer soluções”, disse. Segundo ele, já existe demanda. “Vejam o PGBL e o VGBL, produtos que impulsionaram o mercado nos últimos 20 anos”, disse, acrescentando que o mercado de seguros terá muitas discussões pela frente para promover a acessibilidade de seus produtos.
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