20 Anos do Código Civil e o Seguro
Voltaire Marensi - Advogado e Professor
Nossas estimadas leitoras e distintos leitores hão de perguntar: qual a correlação de 20 anos do Código Civil e o Seguro?
Passo a explicar. O Código Civil vigente fez 20 anos em 10 de janeiro de 2022, data de sua publicação no DOU.
A vacatio legis - férias da lei - foi determinada no antepenúltimo artigo, vale dizer, 2.044, assim redigido:
“Este Código entrará em vigor 1 (um) ano após a sua publicação”.
E o Seguro? Além de estar sistematizado no Decreto-Lei nº73, de 21 de novembro de 1966, portanto, com quase 56 anos de existência, o nosso Código Civil, lei ordinária, prevê esse contrato em seus artigos 757 a 802. Convido a atenção de todos para uma de minhas obras, ou seja, O Contrato de Seguro à Luz do Novo Código Civil. Thomson/Iob, 3ª edição, que comento artigo por artigo a matéria em sede securitária.
Pois bem. Antes de se fazer um breve cotejo entre os dois diplomas legais – Código Civil e Seguro – é imperiosa a necessidade de se pontuar que o Seguro é um contrato inserido nas várias espécies de contrato daquele Código.
Nesse sentido, o Código civil é composto de uma Parte Geral, do Direito das Obrigações que prevê o contrato de seguro como parte integrante das várias espécies de contrato, do Direito das Coisas, do Direito de Família e do Direito das Sucessões.
Para se delimitar um pequeno marco entre os diplomas focados, o contrato de seguro está imbricado, praticamente, em todas as vertentes composta dos cinco pilares que integram o nosso Código Civil. Impende sublinhar, ao azo, Parte Geral, Obrigações, Coisas, Família e Sucessões.
Passo, ligeiramente, a registrar exemplificativamente.
Na Parte Geral quando o legislador civilista diz em seu artigo 104, inciso IV, que a validade do negócio jurídico requer:
- .....
- Objeto lícito, ...
Não se faz negócio quando o segurado objetiva segurar entorpecentes, já que se cuidaria de um bem ilícito.
No Direito das Obrigações é aonde ele mais sobressai, pois há 45 artigos que tratam do contrato de seguro. Ouso afirmar que poderia ser considerado um número razoável inserto em uma legislação ordinária, que, mesmo assim, careceria de uma melhor sistematização e modernidade condizente com os dias atuais.
É necessário que haja uma reforma estruturante de nossos institutos que devem, como regra geral, partir do Poder Legislativo.
No ponto, diz o artigo 48 da CF/88:
“Cabe ao Congresso nacional, com a sanção do Presidente da República, não exigida esta para o especificado nos arts. 49,51 e 52, dispor sobre todas as matérias de competência da União, especificamente sobre:
.................
XIII- matéria financeira, cambial e monetária, instituições financeiras e suas operações.
Não se ignora a divergência neste tema doutrinário constitucional, sobretudo porque foi derrogado o artigo 192 de nossa Carta Magna que cuidava do Sistema Financeiro Nacional.
Todavia, não é tema que quero tratar e enfatizar até porque me considero pretensamente civilista, ramo afeto ao direito privado. Os constitucionalistas de plantão, que teçam seus comentários e divergências atinentes à área pertinente, isto é, ao direito público.
Prossigo, estimadas leitoras e meus bons amigos leitores!
Com o Direito das Coisas o seguro é também referenciado. É de sabença curial que se faz seguro para condomínio edilício previsto, entre outras inúmeras normas, que o civilista comandado pelo eminente Professor Miguel Reale nos brindou com o atual Código Civil de 2001.
No direito de Família que é mais impulsivo e extremadamente dinâmico a exemplo de se saber se a companheira poderá ser beneficiária de seguro vida deixado pelo falecido, malgrado esse, ainda, quando vivo, detinha e ostentava um casamento válido e eficaz perante terceiros. Prevalece aí o princípio da autonomia da vontade, ou há impedimento legal a teor da dicção do artigo 793????, matéria que ensejou meus comentários nesse sítio em relação ao julgamento em sede de Recurso Especial.
Por fim e por amor à brevidade desta crônica, no Direito das Sucessões o contrato de seguro é jure próprio, nos termos previstos no artigo 794 do Código Civil, assim redigido:
“ No seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dívidas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito”.
Assim também acontece com o contrato de Previdência Complementar, embora com natureza jurídica distinta do contrato de seguro por suas características especiais. Diz o artigo 11º da lei Complementar 109, de 29 de maio de 2001:
‘Para assegurar compromissos assumidos junto aos participantes e assistidos de planos de benefícios, as entidades de previdência complementar poderão contratar operações de resseguro, por iniciativa própria ou por determinação do órgão regulador e fiscalizador, observados o regulamento do respectivo plano e demais disposições legais e regulamentares”.
Ao ensejo de meus comentários a esse artigo disse na parte final;
“ O legislador deveria ter se utilizado da expressão “transferência de risco”, que guarda mais sintonia com o sistema de previdência privada (hoje complementar), ao revés da utilizada no caput deste dispositivo, que fala em “operações de resseguro”, linguagem intimamente imbricada com o instituto do contrato de seguro”. (A Nova Lei da Previdência Complementar Comentada. Editora Síntese. 2001, página 22).
Poderia me estender mais! E bem mais!
O que é o Seguro de Responsabilidade Civil previsto em um único dispositivo de nosso Código Civil?
Disto já falei algures em diversos comentários sobre o instituto acima referenciado.
Deixo ao trabalho e a pesquisa do que registrei em diversas manifestações de outrora.
Boa leitura!
Porto alegre, 06/04/2022
Voltaire Marensi - Advogado e Professor
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