Embriaguez ao Volante
Voltaire Marensi - Advogado e Professor
A embriaguez do segurado não exime a seguradora do pagamento da indenização prevista em contrato de seguro de vida, conforme diz o enunciado 620 do Superior Tribunal de Justiça.
A matéria veio novamente à balha, ontem, 19/10/21, quando a 4ª Turma daquela Corte julgou o tema no qual a seguradora teria alegado que não deve ser concedida cobertura securitária, nos termos da apólice de seguro de vida, em caso de uma pessoa falecida em acidente de veículo, quando alcoolizado.
O caso foi suspenso em razão de pedido de vista do Ministro Luis Felipe Salomão nos autos do AgInt nos EDcl no Resp 1.817.854/RS, em que se ressaltou ter a seguradora apresentado memorial no sentido de pleitear a excludente de cobertura de seguro vida, associada à velocidade excessiva por ocasião do sinistro.
Em sua decisão o relator, Ministro Antonio Carlos Ferreira, fez questão de destacar a dicotomia existente entre seguro de vida e seguro de dano, dizendo:
“É uma oportunidade para revisitar essa jurisprudência. A jurisprudência da Corte vem embaralhando esses dois conceitos (dano material e dano à vida). É uma boa oportunidade para esclarecer essa confusão entre os julgados da Corte”.
Face a essa colocação dita pelo relator registro, aqui, o que escrevi alhures, afirmando ser nosso país diferente de outros, quer de tradição latina ou anglo-saxã que tratam o assunto de forma sistemática e detalhada. Nesta toada mestres com M. Picard e A. Besson identificam a distinção do aumento do risco da exclusão do risco. Les Assurances Terrestres. Le Contrat d’assurance. Paris, página 147).
Os franceses, aliás, inexcedíveis no trato da responsabilidade civil e bem assim no direito securitário, assinalaram em seu Código de Seguros, verbis:
“Art. L. 211-6. Est réputée non écrite tout clause stipulant la déchéance de la garantie de l’ assuré em cas de condamnation por conduite em état d’ ivresse ou sous l’empire d’um état alcoolique ou pour conduite aprés usage de substances ou plantes classées comme stupéfiants”. Code des Assurances, Lexis. Litec. 2008, pág. 323.
Em tradução livre: não é válida a cláusula que exclui a garantia do segurado na hipótese de condenação por conduzir em estado de embriaguez, ou sob império de um estado alcoólico ou por conduzir após uso de substância ou plantas classificadas como entorpecentes.
Na União Europeia, por exemplo, existem seguradoras que estipulam cláusulas específicas de exclusão por embriaguez, desde que sejam encontrados índices de graduação alcoólica de O,5 a O, 8 decigramas por litro de sangue na pessoa do condutor. Dessarte, as Companhias seguradoras fizeram incluir referida cláusula justamente em razão do repúdio dos tribunais em permitir a exclusão da cobertura por alcoolemia episódica. (Voltaire Marensi. O Seguro, a Vida e sua Modernidade. 2ª edição. Lumen/Juris/editora, página 378).
Pois bem. A meu sentir, tanto no seguro de danos como no seguro de pessoas deve ser observado um princípio geral em sede de contrato de seguro, vale dizer, se houve no caso concreto agravamento intencional do risco objeto do contrato. (Vide art. 768 do Código Civil).
É em razão dessa situação fática que o falecido Ministro José Augusto Delgado, quando comentou o artigo acima referenciado disse:
“ A jurisprudência tem firmado posição no sentido de que o fenômeno da agravação do risco merece exame de forma restritiva, isto é, só se pode considera-lo como existente quando, na realidade, houver prova concreta que o segurado agiu intencionalmente para sua consumação”. (Comentários ao Novo Código Civil. Editora Forense. Volume XI, Tomo I, 2004, página 243).
Diante do que aqui brevemente se acha exposto calha à espécie outro princípio basilar em sede de direito securitário, impende sublinhar, o da boa-fé, pois como registrou o nosso saudoso Professor e Paraninfo da Turma de 1.970 da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Clóvis Veríssimo do Couto e Silva, “ a aplicação do princípio da boa-fé tem, porém, função harmonizadora, conciliando o rigorismo lógico-dedutivo da ciência do direito do século passado com a vida e as exigências éticas atuais, abrindo, por assim dizer,, no hortus conclusus do sistema do positivismo jurídico, “janelas para o ético). Esser Grundsatz und Norm. A Obrigação como Processo. 1.964, página 43).
Oxalá se sistematize no final do julgamento do processo acima identificado, mais uma jurisprudência aonde se consolide lídimos princípios jurídicos atrelados ao bom direito, quer atentando para o consumidor, quer para a seguradora diante daquilo que se produziu nas instâncias inferiores de vez que o Egrégio Superior Tribunal de Justiça não reexamina a prova a teor de seu enunciado de número 07. Que prevaleça, então, a questão federal no deslinde do julgamento definitivo.
Porto Alegre, 20 de outubro de 2021
Voltaire Marensi - Advogado e Professor
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