Seguros de Automóveis. Novas Regras
Voltaire Marensi - Advogado e Professor
Com a edição da Circular SUSEP, de 9 de agosto de 2021, publicada no Diário oficial da União em 13/08/2021, foram criadas novas regras e critérios para operação de seguros do grupo automóvel.
Contendo vinte e um artigos pretendo desenvolver um trabalho de exegese que, em princípio, não creio que dê para esgotar em uma única e isolada crônica estas novas regras, que, aliás, em seu artigo 20, revoga três Circulares anteriores e duas Cartas-Circulares.
O artigo 2º me deixa um pouco mais aliviado quando diz que essas disposições deverão observar a legislação e regulamentação em vigor, em especial aquelas aplicáveis aos seguros de danos, quando não conflitarem com a presente norma. Menos mal. Porque, assim, de início, a Circular em comento observa o princípio básico da hierarquia das normas que no caso é configurado em nosso Código Civil. (Seguros de Danos. Seção II, do Capítulo XV, artigo 778 até 788).
Outro ponto interessante, diz respeito a exclusão do seguro de responsabilidade civil do proprietário que ingressar, em viagem internacional, em países membros do Mercosul em razão do Seguro Carta Verde instituído pela Resolução 120/94 e sob atuação do Grupo Comum do Mercosul. Também não se aplicam aos seguros DPVAT e ao seguro garantia estendida-auto, que possuem regulamentação específica. (Art. 1º).
Garantia estendida não é seguro, data vênia. Vide parecer exarado pelo cronista em um de seus livros.
Retomando, novamente, o enfoque das normas insertas nessa Circular.
Nas Disposições Iniciais a Circular andou bem, pois não extrapola o que determina nossa lei ordinária.
Todavia, nas Disposições Gerais, Capítulo II, que cuida da estruturação de coberturas, o artigo 3º dispõe que “as coberturas de casco no seguro de automóvel podem abranger, de forma isolada ou combinada, diferentes riscos a que esteja sujeito o veículo segurado”. Sem maiores ressalvas no ponto.
A situação começa, a meu sentir, ficar um pouco mais nebulosa quando seu artigo 4º trata das coberturas de casco que poderão ser oferecidas nas modalidades de valor de mercado referenciado, de valor determinado e/ou com outro critério objetivo e transparente para determinação do limite máximo de indenização. (LMI).
Essas casuísticas acima previstas já deram “muita dor de cabeça” em um passado recente. Valor referenciado e valor determinado geraram muita polêmica no passado nos tribunais em casos de perda total do veículo segurado. Muitos segurados recebiam o valor fixo em reais, sem qualquer índice de correção, mormente quando o segurador pagava o sinistro sem atualização monetária devida no tempo do pagamento ao segurado, afrontando o que determina, expressamente, o artigo 772 do nosso Código Civil.
Seria bem melhor fixar um quantum indenizatório baseado no valor de mercado, respeitando o preço de um veículo segurado da mesma marca em bom estado de conservação.
Tudo isto sem falar que segurado e alguns corretores de seguros não sabiam bem a distinção, assim como os Tribunais decidiam pelo Brasil afora.
A Circular explica, aqui, vale dizer, nos parágrafos do artigo acima ventilado, a dicotomia entre a modalidade valor de mercado referenciado e valor determinado, isto é, no primeiro e no segundo, respectivamente, do artigo 4º, é bem verdade.
O primeiro garante ao segurado o pagamento de quantia variável, determinada de acordo com tabela de referência indicada na proposta do seguro, conjugada com fator de ajuste, em percentual acordado entre as partes obedecendo o valor da cotação do veículo.
Será que dará certo um ajuste em um contrato típico de adesão?
O segundo, vale dizer, o valor determinado prevê uma quantia fixa estipulada pelas partes.
Essa quantia fixa será justa? O prêmio pago pelo segurado será também reajustado???
O § 3º do artigo 4º diz que “as coberturas de casco poderão ser estruturadas de forma parcial, com assunção apenas de parte do risco pela sociedade seguradora, conforme critérios estabelecidos nas condições contratuais.
Será que tal disposição além de confusa não gerará uma dissenção entre segurado e seguradora quando se fala em “assunção de parte do risco”. Que parte? Entendo, com a devida vênia, que, ou a seguradora assume o risco integral do veículo, ou declina de sua cobertura. Não estamos a tratar de seguro de bem imóvel com aplicação de cláusula de rateio!!!
O artigo 5º cuida dos critérios indicados na utilização de tabela de referência para determinação do LMI e o seu parágrafo único alude a tabela substituta. Será que tal procedimento alternativo é válido?
Esclareço aos nossos estimados leitores e caras leitoras que não se cuida de obrigação alternativa prevista nos artigos 252 ao 256 do nosso Código Civil, no qual a seguradora poderá pagar o valor contratado na apólice de seguro ou, alternativamente, repor um bem de igual valia.
São situações completamente distintas e totalmente díspares!
O artigo 6º retrata hipótese de seguro contratado sem identificação exata do veículo segurado, que, segundo a SUSEP, estaria alinhada a práticas internacionais como, por exemplo, o acesso a motoristas de aplicativos e condutores que já adotam o compartilhamento de automóveis, utilizando carros por assinaturas ou alugados. Será que o exemplo de fora sempre é o melhor? Houve um tempo na Rússia que para maior facilidade na contratação do seguro automóvel as seguradoras tiveram que instalar câmaras nos veículos para se alforriar até de casos suicidas em que as pessoas, literalmente, se lançavam à frente destes automóveis em face da flexibilização do contrato de seguro automóvel.
Deixo, no entanto, tal registro para a reflexão de todos!
A cobertura de acidentes pessoais pode, de fato, estar acoplada a cobertura de qualquer veículo automotor com previsão normativa plasmada no artigo 7º da Circular, assim como é o caso nos Seguros de Pessoas, vulgarmente cognominados de Seguro de Vida que, a título ilustrativo, ao azo, acoberta o suicídio do segurado praticado por ele depois de 2 anos de sua contratação. Isso, enfim, é uma outra matéria, antigamente, prenha de debates.
As coberturas do ramo “assistência e outras coberturas auto” são típicas de outros ramos de seguro do grupo automóvel que deverá, segundo o teor do artigo 8º e seu parágrafo único, estar claramente estipulado nas condições contratuais.
Na próxima crônica tratarei de analisar outros itens destacados nesta Circular, sem deixar de registrar nesta uma curiosidade que já adianto aos nossos estimados leitores e caras leitoras: a possibilidade de utilização de peças usadas!
Sim. Ninguém leu errado. Será a possibilidade e admissão do uso de peças de veículo, certamente, provenientes de ferro velho como diz uma das estrofes dessa canção carnavalesca, burlescamente cantada por Ivete Sangalo:
“Quer andar de carro velho amor, que venha,
Pois eu sei que amar a pé amor, é lenha!
Quer andar de carro velho amor, que venha, pois eu sei que amar a pé amor, é lenha!
Quem viver, verá e quem ler a próxima crônica saberá o que estou a dizer.
Porto Alegre, 13/08/2021
Voltaire Marensi - Advogado e Professor
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