O Desacerto na Alteração da Prescrição no Seguro
Diante do conhecimento que se colhe na mídia tomei ciência de um projeto de lei apresentado na Câmara dos Deputados pretendendo incluir um parágrafo único ao inciso IX do artigo 206 do Código Civil, que trata do prazo prescricional de três anos estipulado em sede de contrato de seguro de pessoas, bem como do terceiro prejudicado no caso de responsabilidade civil obrigatório.
O projeto também pretende acrescentar um § 5º ao artigo 11 do Decreto-Lei nº73/66, que para maior compreensão se transcreve abaixo:
“ A sociedade seguradora tem o dever de informar o beneficiário, postalmente ou por sistema telemático, da existência do contrato de seguro ou da operação de capitalização, da sua qualidade de beneficiário e do seu direito às importâncias devidas pelo contrato de seguro ou pela operação de capitalização, sempre que tenha conhecimento da morte do segurado ou do subscritor, no prazo de até 30 (trinta) dias após a data do conhecimento. (AC). Sic
É aí que reside, a meu sentir, o maior desacerto. Pois, penso que esta alteração proposta no artigo 11 do Decreto-Lei nº 73/66 não é o lugar mais adequado.
O motivo é relativamente simples. O caput do artigo 11 da norma em tela diz:
“Quando o seguro for contratado na forma estabelecida no artigo anterior, a boa-fé da Sociedade Seguradora, em sua aceitação, constitui presunção “juris
tantum”. (Isto é, até prova em contrário). Sic
Assim, preliminarmente, se houver uma alteração de lege ferenda (como a norma deve ser feita) este enunciado teria que ser aposto no mencionado Código Civil, impende sublinhar, na Seção III que cuida “Do Seguro de Pessoas” e no artigo 788 que trata dos seguros de responsabilidade legalmente obrigatórios. Aí, data vênia, é o locus mais condizente com a sistemática legal.
Embora sendo o Decreto-Lei nº73/66 a estrutura do Sistema Nacional de Seguros, o nosso Código Civil é o que disciplina com extrema propriedade e casuística o contrato de seguro, nomeadamente o Seguro de Pessoas.
Ademais, é princípio assente em boa hermenêutica que a lei posterior – no caso o Código Civil – tem preferência sobre um texto geral e de menor atualidade.
Porém, não se adstringe só por aqui minha manifestação contrária ao projeto de lei em comento nos termos em que está lançado.
A informação obrigatória (dever), imperativo categórico kantiano, ao beneficiário embora se cuida de um direito próprio – o seguro – e não de um direito hereditário em que haverá a abertura de um inventário no caso em que o falecido deixe bens, entendo, venia concessa, que a sociedade seguradora contratou com uma parte que é o segurado. Neste sentir, segurado e segurador têm direitos e obrigações recíprocas que devem viger no contrato de seguro.
Já um beneficiário é um terceiro, teoricamente, uma pessoa que não participa da contratação do seguro. É um contrato que se fulcra na máxima romana res inter alios acta, aliis neque nocet neque potest, ou seja, o contrato só obriga aqueles que tomaram parte em sua formação, não prejudicando e nem aproveitando a terceiros, já que ninguém pode tornar-se devedor ou credor em sua plena aquiescência. (https://www.jusbrasil.com.br)
Ademais, imaginem estimados leitores e leitoras, quando o segurado substitui o beneficiário no seguro de vida a qualquer momento da vigência do contrato. E isto ocorre frequentemente na prática destes negócios jurídicos.
Um outro pensar também se dirige aos seguros de responsabilidade civil, quer facultativos ou obrigatórios quando a vítima é indeterminada só se determinando no momento do sinistro.
O dever de informação, segundo o projeto de lei apresentado, seria feito ao “beneficiário”, “postalmente ou por sistema telemático.
O termo telemático https://maplink.globla.blog resulta da junção das palavras telecomunicação (serviços de telefonia, fibra óptica, satélite, cabo, etc ( e informática (softwares, computadores, sistemas de redes, periféricos etc) e se refere a qualquer sistema que transmite dados pela rede, seja em formato de texto, imagem ou som.
Por essas breves considerações e pelo abalo que geraria no mercado segurador acredito que esta matéria não deva ser aprovada pelo Congresso Nacional.
Por fim, é verdade que “matérias fatiadas” são mais simples de serem aprovadas como foi antes do advento do Código de Processo Civil de 2015.
Todavia é preciso pensar que um texto mais moderno como se lançou, por exemplo, pelo IBDS, que alguns colegas dizem que já estaria desatualizado, mas, que, sem dúvida alguma, merece maiores considerações pelos parlamentares uma vez que o que atualmente existe já está totalmente defasado pelo tempo.
Enfim, vamos perseguir um texto mais abrangente e mais escorreito em sede de direito do seguro.
É o que penso.
Porto Alegre, 21 de junho de 2021
Voltaire Marensi - Advogado e Professor
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