Doenças Raras em Planos de Saúde
No julgamento do Recurso Especial nº 1.885.384/RJ, datado de 18 de maio de 2021, a Terceira Turma do STJ, relator Ministro Paulo de Tarso Sanseverino, por unanimidade, com ressalvas da ministra Fátima Nancy Andrighi, decidiu que em se cuidando de casos de doenças raras ou ultrarraras, vale dizer, no caso com incidência menor ou igual a um caso para cinquenta mil habitantes, há, segundo o voto do Relator ora em comento, substancial diferença material entre o caso em tela e os paradigmas correlatos, sendo suficiente a amparar a necessidade de não aplicação da ratio decidendi - razão de decidir- dos precedentes que deram ensejo ao Tema 990 do Superior Tribunal de Justiça.
Em ligeira síntese, estimados leitores e leitoras, Tema é o recurso julgado pela sistemática descrita no Código de Processo Civil no qual, no caso concreto, o STJ define uma tese que deve ser aplicada aos processos em que é discutida idêntica questão de direito. Ele está previsto no artigo 1.036 do CPC de 2015, que cuida do recurso repetitivo, ou seja, sempre que houver multiplicidade de recursos extraordinários ou especiais com fundamento em idêntica questão de direito, haverá afetação para julgamento de acordo com as disposições desta Subseção, observado o disposto no Regimento Interno do Supremo Tribunal Federal e no Superior Tribunal de Justiça.
Em síntese, o mérito recursal pode ocorrer por amostragem, mediante a seleção de outros recursos que representem de maneira adequada, a controvérsia. É o conhecido e denominado recurso repetitivo.
No caso vertente, cuida-se na utilização de um anglicismo com nomes identificados de distinguishing e defiance, ambos, plasmados no direito norte-americano.
Neste diapasão o Supremo Tribunal Federal no tema 500 - lá chamado repercussão geral -, autorizou de forma excepcional, a importação de medicamentos com eficácia e segurança comprovada e testes concluídos, embora sem registro na ANVISA, sempre nas hipóteses de doenças raras e ultrarraras.
A hipótese sub judice cria exceção ao que decidiu a 2ª Seção do próprio STJ, em sede de recurso especial repetitivo, quando assentou que as operadoras de planos de saúde não estão obrigadas a fornecer medicamento não registrado pela ANVISA. (Tema 990).
Destarte com fica esta quaestio juris?
Salvo engano, no caso em foco no entender do Ministro Relator, sempre que houver uma substancial diferença material.
Resta saber casuisticamente quando haverá, no caso concreto, uma substancial diferença material?
Acredito que no caso sub judice torne-se bastante tormentoso o significativo caso, aliás, de elevada solidariedade e de extremado altruísmo de parte dos Julgadores, não obstante outros processos a ser julgados futuramente que mereçam a atenção e o respeito de que toda a pessoa humana detém, vale dizer, o seu direito à dignidade consagrado constitucionalmente.
Todavia, a meu sentir, o que sobressai é a relevância do caso concreto, já que sempre nos contratos dessa espécie teremos de lidar com um dos princípios básicos do seguro – da proteção de qualquer grupo - insuflado no princípio do mutualismo. É o que dizia em minhas aulas, ou seja, a não aplicação do lema um por todos ou todos por um do grande escritor, Alexandre Dumas, na obra Os Três Mosqueteiros, que nem sempre poderá ser invocada quanto à solidariedade uma vez que muitos segurados e associados precisam repartir riscos para haver uma verdadeira equanimidade e equilíbrio contratual, quer no de seguro, quer no de vida, quer no de plano de saúde.
Enfatizo à exaustão o que tenho dito em sede de contratos de planos de saúde no sentido de como ficarão estabelecidas as regras de reajustes, por conta daquele princípio – mutualismo - vez que todo o reajuste é inevitável quando acontece no grupo um sinistro que, teoricamente, desequilibra a relação contratual – se tratam de contratos relacionais - não se ajustando aos cálculos atuariais ínsitos nos contratos-tipos desta espécie.
Acredito, em síntese, que a decisão em si é altamente elogiável rendendo, ao azo, meus redobrados encômios ao Ministro Relator, mas, que, venia concessa, se torna preocupante no que concerne às futuras aplicações de teses jurídicas que, via de regra, guardam a mesma similitude e identidade.
Vamos aguardar o decurso do tempo que acredito ser o melhor conselheiro para planejarmos, quem sabe, uma melhor adequação dos casos à espécie.
É o que penso, salvantes doutos suprimentos que entendam de outra forma, visceralmente, distinta do que acabo de expor.
Porto Alegre, 25/05/2021
Voltaire Marensi - Advogado e Professor
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