Cliente Oculto e Ombudsman
Voltaire Marensi - Advogado e Professor
Analisando a Resolução CNSP nº 382, de 04.03.2020, que dispõe sobre princípios a serem observados nas práticas de condutas adotadas pelas sociedades seguradoras, sociedades de capitalização, entidades abertas de previdência complementar e intermediários, no que se refere ao relacionamento com o cliente, e sobre o uso do cliente oculto na atividade de supervisão da Susep, entendo que há uma íntima imbricação entre a figura do cliente oculto e do ombudsman.
A sobredita Resolução trata especificamente do cliente oculto em seu inciso II, do artigo 2º, quando diz:
“Cliente oculto: servidor da Susep designado, que assume a figura do proponente ou interessado em adquirir produtos de seguros, de capitalização ou de previdência complementar aberta, com o objetivo de verificar a adequação e a conformidade das práticas de conduta do ente supervisionado ou do intermediário à regulação vigente”.
Segundo se colhe de informações da mídia eletrônica ele, cliente oculto, funciona como um cliente misterioso, constituindo-se numa metodologia interativa utilizada por empresas de diversos ramos objetivando avaliar minuciosamente seus produtos e serviços. Em apertada síntese: funciona como uma espécie de auditoria, e como uma ouvidoria a serviço do consumidor.
Em um caso julgado pelo TRT – 18, datado de 08 de maio de 2015, em que um reclamante teria sido dispensado discriminatoriamente de suas atividades laborais, por conta da prática de cliente oculto, aquele tribunal entendeu, à época do julgamento, que cada empregador deve estabelecer seus regulamentos adotando medidas administrativas, diretivas e disciplinares, a seu molde. De fato. Não há na lei vigente, qualquer previsão de medida que discipline esta figura que circula e gravita no mercado empresarial, mas que é adotada para aprimoramento de métodos e resultados no âmbito mercadológico.
Já a figura do ombudsman de origem sueca, norueguesa dinamarquesa, significa “aquela que representa”. Nos países de língua portuguesa as palavras de ouvidor ou provedor têm o mesmo significado. Ele, ombudsman, “é um cargo profissional contratado por um órgão, instituição ou empresa com a função de receber críticas, sugestões e reclamações de usuários e consumidores, com o dever de agir de forma imparcial para mediar conflitos entre as partes envolvidas”. (Vide in Wikipédia).
Poder-se-ia numa interpretação mais elástica invocar a figura jurídica criada pelo Código de Processo Civil de 2015, a teor da mediação prevista no artigo 334 que, antes da audiência de conciliação no processo, tem o mediador a incumbência da autocomposição entre os litigantes, tudo de acordo com o § 11º do sobredito dispositivo legal.
À guisa, por exemplo, de linguagem diplomática, “ a mediação se entende como os bons ofícios empregados por um país para que se solucione a questão ou controvérsia havida entre duas potências. (In, Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico, Forense, 1.975).
Poder-se-á entender também que o mediador é um procedimento de resolução informal, porém estruturado em bem servir um conflito que venha a ser criado em razão de desavença oriunda de um bem da vida. Segundo o inesquecível processualista italiano Francisco Carnelutti, “ surge conflito entre dos intereses cuando la situación favorable a la satisfacción de una necesidad excluye la situación favorable a la satisfacción de una necessidade distinta. (Sistema De Derecho Procesal Civil, Uteha Argentina, Buenos Aires, 1944, pág. 17).
Na sobredita resolução “ o cliente oculto poderá pesquisar, simular e testar, de forma presencial ou remota, o processo de contratação, a distribuição, a intermediação, a promoção, a divulgação e a prestação de informações de produtos, de serviços ou de operações relativos a seguro, capitalização ou previdência complementar aberta, com vistas a verificar a adequação das práticas de conduta de intermediários e entes supervisionados à regulação vigente” (Caput da Resolução CNSP nº 382/20).
Impende sublinhar que a sobredita Resolução entra em vigor em 1º de julho de 2020. (Art. 17).
Enfim, a figura do cliente oculto irá prestar um serviço de bom atendimento aos consumidores, notadamente em relação à atuação das partes envolvidas em todos os contratos relacionados quer ao seguro, quer à previdência complementar e seus intermediários, inclusive o próprio corretor de seguros que faz parte integrante desta valorosa cadeia produtiva.
De tal arte, valorizando-se o consumidor se enriquece o nosso mercado segurador como um todo.
Porto Alegre, 17/06/2020.
Voltaire Marensi - Advogado e Professor
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