Para urbanista, obras de mobilidade em Goiânia priorizam carros e esquecem pedestres
Com uma frota de 1,2 milhão de carros e motos, somos a terceira capital do País com maior taxa de motorização. Mesmo com excesso de veículos, cidade insiste na construção de viadutos e infraestruturas que desincentivam trânsito seguro das pessoas e ciclistas
Sobre trânsito o dicionário diz: “1. Ato de transitar. 2. Afluência, circulação de pessoas”. Pois é, não fala nada sobre carros e motos. Mas, após décadas e décadas vendo cidades crescerem desordenadamente sem priorizar pessoas, passamos a achar normal que as ruas sejam feitas só para os veículos. E não é. Se você também só pensa em carros e motos quando ouve falar em trânsito, é hora de rever o seu conceito sobre esta palavra e a cidade onde você mora repensar as políticas de mobilidade urbana.
Para o arquiteto e urbanista Paulo Renato Alves, o Dia Nacional do Trânsito, a ser comemorado no próximo 25 de setembro, deveria ser dedicado à celebração de ações que facilitem e incentivem o trânsito seguro das pessoas. Segundo o especialista, praticamente todas as obras de mobilidade feitas em Goiânia são para facilitar e incentivar o trânsito de carros particulares e não de pedestres e ciclistas. “Quais são as principais obras de infraestrutura de mobilidade que são feitas na cidade? Viaduto. Nos últimos anos foi praticamente um viaduto por ano. O viaduto melhora a fluidez do trânsito de carros e motos, mas quanto mais espaços você dá para os veículos automotores, mais espaço você tira dos pedestres e dos ciclistas”, esclarece.
Em Goiânia é difícil dissociar trânsito da imagem de carros e motos, afinal somos uma cidade que tem quase que um veículo automotor para cada habitante. Com uma frota de 1,2 milhão de carros e motos, somos a terceira capital do País com maior taxa de motorização. São 80 veículos automotores a cada 100 habitantes, segundo levantamento feito com base em dados do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran).
Ficamos atrás apenas de outras duas capitais, Belo Horizonte e Curitiba, que por coincidência são sedes de grandes empresas de locação de automóveis e rodam o Brasil inteiro. Isso nos faz deduzir que Goiânia, levando em conta o critério do local de emplacamento, é a cidade brasileira que mais efetivamente tem carros e motos por habitantes no País.
Pedestres sem espaço
Para exemplificar o problema de como Goiânia prioriza mais os carros do que as pessoas no seu planejamento de mobilidade urbana, Paulo Renato cita obras recentes em Goiânia, como os viadutos construídos nos cruzamentos da Rua 90 com Avenida 136 e da Avenida Deputado Jamel Cecílio com a Marginal Botafogo, que só facilitaram a vida dos carros, mas não dos pedestres e ciclistas.
“O próprio cruzamento da [Rua] 90 com a [Avenida] 136 ficou muito mais perigoso de se atravessar. No cruzamento da Avenida Deputado Jamel Cecílio com a [Marginal] Botafogo é o mesmo problema, espaço só para os carros passarem com mais velocidade e isso automaticamente espanta o pedestre e ciclistas”, esclarece.
Exemplos fora
Para o arquiteto e urbanista, as políticas de mobilidade urbana adotadas por Goiânia vão na contramão do que modernas cidades mundo afora têm feito. Ele explica que a vanguarda nas grandes metrópoles como Nova Iorque e Barcelona é incentivar a caminhabilidade, com cidades compactas e inteligentes, com vários centros de serviços e comércio consolidados, desincentivando o uso de carros e motos e dando muito mais espaço nas ruas para os pedestres e ciclistas.
“Você tem em Barcelona, na Espanha, um case fantástico, que é a famosa avenida Las Ramblas, que corta toda a região central da cidade e funciona como um enorme calçadão com extensão de 1,2 quilômetro totalmente dedicada a pedestres, onde a restrição é para os carros, ou seja, é uma avenida para pessoas e não para veículos. Outro exemplo bacana é a cidade de Santiago, no Chile, em que você tem muito mais espaço para os pedestres nas calçadas, que são 100% acessíveis, com rebaixo em todas as esquinas. Lá, é um lugar onde um cadeirante pode se locomover com total autonomia e a longas distâncias”, exemplifica o especialista.
Falta de planejamento
Além de criticar o excesso de obras de mobilidade voltada para veículos automotores, Paulo Renato também questiona a qualidade dessas construções. Ele cita novamente a obra do cruzamento da Rua 90 com a Avenida 136, no Setor Marista. “Você tem, por exemplo, a Rua 90, onde há trechos onde a passagem é restrita a um único veículo, se houver um acidente ou este veículo estragar você tem uma ‘AVC’ no trânsito de todo o Setor Oeste e Setor Aeroporto. Tudo por causa de uma obra mal planejada”, critica o urbanista.
Ainda apontando Goiânia como uma cidade que se preocupa mais com carros do que com os pedestres, o urbanista critica a falta de investimentos da prefeitura em infraestrutura voltada para a segurança e melhor caminhabilidade de pedestres. “A prefeitura investe milhões para construir viaduto, para fazer corredores exclusivos, para cortar a cidade inteira e fazer o BRT, mas não tem dinheiro para arrumar as calçadas, o que fica a cargo do dono do terreno. E como não há fiscalização, cada um faz de um jeito, não há um padrão”, contesta o arquiteto e urbanista.
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