Percepção, verdade e interesses
*Por Ciro Rosolem, vice-Presidente de Comunicação do Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS) e Professor Titular da Faculdade de Ciências Agrícolas da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (FCA/Unesp Botucatu)
Já recebi piadas pelo WhatsApp eliminando o ano de 2020, dizendo que não teria servido para nada! Não concordo. O ano começou com esperança e alta expectativa, mas...
Apesar do desempenho maravilhoso do setor agrícola, o ano tem sido emocionante, para o bem e para o mal. Começou lá atrás, com a aprovação do Acordo de Comércio Europa-Mercosul.
Sabíamos que não seria fácil. Bom, e o que tem a ver? Tem a ver que todo barulho que os europeus vêm fazendo, liderados por França e Alemanha, que culminou com carta ao nosso Vice-Presidente cobrando “ações reais imediatas” contra o desmatamento, com ameaça de pararem com investimentos no Brasil e compras de nossos produtos, no fundo no fundo, não se refere a ambiente. Refere-se à proteção dos produtores rurais deles, altamente subsidiados, e fortes lobistas. Essa é a verdade, ou pelo menos, boa parte dela. Mas, quem liga para verdade?
Numa perspectiva histórica, considerando-se o clima e onde o desmatamento e o fogo na Amazônia estão ocorrendo, o panorama não é tão grave quanto aparece nas fotos de jornais. Tivemos então o azar de um ano extremamente seco, com temperaturas acima do normal. E então o fogo. Inclusive no Pantanal. Por incrível que pareça, em alguns locais a preservação ambiental vem alimentando os incêndios. Sim, a preservação resulta em maior massa vegetal que, seca, é excelente combustível. Morrem animais silvestres, e morre o gado, isso sim uma tragédia. Então o atual governo diz que o “desmonte” da fiscalização vem do desgoverno anterior, e os adeptos do governo anterior inundam as mídias denunciando o desgoverno atual. Na verdade, nem tanto cá, nem tanto lá.
Talvez tudo isso nos sirva de lição, aprendizado para o futuro. O jogo econômico é pesado, mas não é prático só se lamentar e dizer que fizemos quase tudo direito, que temos a legislação ambiental mais restritiva do mundo, que preservamos mais florestas que todos. De novo, verdade. Mas, quem se preocupa com a verdade?
Como se trata de percepções, política e uso sem critério de informações parciais, o jogo é muito complexo. Precisamos de um time que, primeiro estabeleça uma defesa forte, e depois estruture um ataque eficaz. Me parece um bom começo a união de organizações ambientalistas e representantes do agronegócio na Coalizão Brasil Clima, Florestas e Agricultura, que acaba de fazer recomendações consensuais ao governo. Trata-se agora de seguir suas recomendações, e alardear pelo mundo sua existência e atitudes.
O setor produtivo está ciente e atento. Mas as forças opostas são poderosas, e “pega bem pôr a culpa nos outros”. Vai ser muito difícil, mas é um começo. Então, há um jogo da verdade, mas há um jogo político e econômico. Ambos precisam ser bem jogados. Precisamos agora que nossos ministérios falem a mesma língua, ao contrário do que ocorreu recentemente quando a área diplomática defendeu a extensão da importação de etanol dos Estados Unidos contra a posição da Agricultura, enquanto nossos estoques estão muito altos. Mas, isso é assunto para outra hora.
Sobre o CCAS
O Conselho Científico Agro Sustentável (CCAS) é uma organização da Sociedade Civil, criada em 15 de abril de 2011, com domicilio, sede e foro no município de São Paulo-SP, com o objetivo precípuo de discutir temas relacionados à sustentabilidade da agricultura e se posicionar, de maneira clara, sobre o assunto.
O CCAS é uma entidade privada, de natureza associativa, sem fins econômicos, pautando suas ações na imparcialidade, ética e transparência, sempre valorizando o conhecimento científico.
Os associados do CCAS são profissionais de diferentes formações e áreas de atuação, tanto na área pública quanto privada, que comungam o objetivo comum de pugnar pela sustentabilidade da agricultura brasileira. São profissionais que se destacam por suas atividades técnico-científicas e que se dispõem a apresentar fatos concretos, lastreados em verdades científicas, para comprovar a sustentabilidade das atividades agrícolas.
A agricultura, apesar da sua importância fundamental para o país e para cada cidadão, tem sua reputação e imagem em construção, alternando percepções positivas e negativas, não condizentes com a realidade. É preciso que professores, pesquisadores e especialistas no tema apresentem e discutam suas teses, estudos e opiniões, para melhor informação da sociedade. É importante que todo o conhecimento acumulado nas Universidades e Instituições de Pesquisa seja colocado à disposição da população, para que a realidade da agricultura, em especial seu caráter de sustentabilidade, transpareça. Mais informações no website: http://agriculturasustentavel.org.br/. Acompanhe também o CCAS no Facebook: http://www.facebook.com/agriculturasustentavel.
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