Pesquisa identifica compostos do arroz aromático brasileiro
Um grupo de cientistas identificou seis compostos que caracterizam o arroz aromático brasileiro. A pesquisa ajudará os agricultores no processo de definição de futuras cultivares que tenham essa propriedade destacada e cujo grão é utilizado em pratos da culinária internacional ou adaptado a receitas nacionais. O estudo foi liderado pela Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), em parceria com a Embrapa e o Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA/ARS). Os resultados do trabalho foram publicados em artigo científico no periódico Cereal Chemistry.
O objetivo do trabalho é agregar valor à rizicultura no País, oferecendo aos agricultores a possibilidade de plantar novas cultivares para atender diferentes nichos de mercado. O arroz aromático é comum na Ásia, América do Norte e Europa, mas sua produção no Brasil e na América Latina ainda é insignificante e o consumo quase totalmente restrito à alta gastronomia.
A pesquisadora da Embrapa Arroz e Feijão (GO) Priscila Zaczuk Bassinello acredita que o interesse por esse arroz tende a crescer, pois as pessoas têm buscado novas experiências culinárias, o que fará o arroz aromático se tornar mais popular.
O cheiro da alta gastronomia
Alguns pratos mais comuns com o cereal aromático são o arroz basmati com frango e curry e, no Brasil, há a adaptação do grão aromático em receitas com manjericão e castanha-do-pará triturada. No livro Delícias com arroz e feijão, da Cozinha Experimental da Embrapa Arroz e Feijão, o arroz aromático entra em várias preparações, destacando-se o bolo sem glúten.
Segundo Priscila, estudos como esse apoiam o trabalho para a oferta de produtos com qualidades diferenciadas. “Com mais conhecimento, agricultores, indústrias e melhoristas podem ajudar na seleção de genótipos brasileiros que, no futuro, irão se tornar novas cultivares de arroz aromático à disposição do consumidor”, prevê.
Molécula lembra o cheiro de pipoca
O principal elemento diferenciador do arroz aromático brasileiro, em relação ao arroz também produzido no País, mas não aromático, é a substância chamada 2-acetil-1-pirrolina, ou 2AP, pertencente ao grupo químico das cetonas e associada por consumidores ao cheiro de pipoca. Essa molécula é um composto volátil natural do arroz aromático e controlada por influência genética. O odor está presente no grão, que, ao ser cozido, desprende mais intensamente a fragrância.
O 2AP é uma substância também encontrada no arroz aromático da Índia, China e Indonésia, e está em variedades comercializadas internacionalmente do tipo Basmati e Jasmine. No estudo, foram utilizados grupos de plantas que fazem parte do programa de melhoramento da Embrapa e originárias dos dois tipos citados, a partir do cruzamento entre Pusa Basmati 1 e Diwani, uma linhagem de arroz aromático Jasmine. No trabalho, foi utilizado o grão integral de arroz, que apresenta quantidade maior de constituintes voláteis em relação ao arroz branco polido.
Assinatura química pode ajudar na rastreabilidade
Os outros cinco compostos voláteis das amostras resultantes desse cruzamento de arroz aromático foram decanal, 2-hexanona, 2-pentilfurano, 1-hexanol e hexanal. De acordo com a pesquisadora, esse conhecimento é importante, pois, com o 2-AP, essas substâncias podem funcionar como biomarcadores. “A presença e a concentração desses compostos podem indicar a interação entre a variedade e o ambiente, abrindo perspectivas de investigações científicas sobre rastreabilidade e autenticidade de produtos, possibilitando futuros estudos de identificação geográfica do arroz aromático brasileiro com potencial agregação de valor. Por exemplo, o 1-hexanol e o hexanal são apontados, respectivamente, como identificadores do arroz branco oriundo da Coréia e da China”, conta.
Rede continental pela qualidade do arroz
Além da característica aromática, o arroz é conhecido por possuir uma série de propriedades que variam muito, conforme o gosto dos consumidores. Mesmo em se tratando do arroz branco polido, a preferência do brasileiro pelo grão longo fino com cozimento soltinho é o oposto da versão, por exemplo, do risoto italiano. Por haver preferências muito específicas, quando o assunto é o cereal, profissionais de diferentes áreas buscam fazer convergir as necessidades da pesquisa: produção, comercialização e consumo. Isso levou à criação de uma iniciativa inédita: a Rede Latino-Americana de Qualidade de Arroz.
Sob a coordenação do professor Nathan Vanier, do Laboratório de Grãos da Universidade Federal de Pelotas (Labgrãos-UFPEL), a rede ainda não tem um número exato de membros porque o momento é de estabelecer interlocução e expandir a base de laboratórios participantes, mas já há integrantes do Brasil, Argentina, Uruguai e Colômbia. Existem também fabricantes de equipamentos compondo um segmento que procura aprimorar tecnologias industriais para atender ao setor.
Segundo Vanier, a rede pretende trabalhar alguns assuntos prioritários em seu primeiro ano de atividades. “As metas são criar um sistema que permita a comunicação de forma mais rápida, segura e moderna entre os participantes dos diferentes projetos e, claro, iniciar as análises e diálogos interlaboratoriais”, anuncia o cientista ao contar que um dos projetos iniciais é a análise interlaboratorial de amilose, viscoamilografia e outras variáveis de qualidade de arroz, tanto para o da classe longo fino como para outras variedades especiais.
Outra meta é o início de ações para definição de padrões de qualidade premium nos diferentes países integrantes da rede. Vanier explica que há até diferenças conceituais de um país para outro. Portanto é necessário padronizar os termos até para orientar normas de comercialização.
“Existe ainda um grupo de participantes que manifestou interesse em atuar nas ações de marketing e divulgação da qualidade e benefícios do consumo de arroz para promoção do produto junto ao consumidor”, declara o professor.
Excelência em produtos do campo à mesa
A pesquisadora da Embrapa Arroz e Feijão foi uma das idealizadoras da Rede Latino-Americana de Qualidade de Arroz. Ela conta que a ideia surgiu de sua participação em outra iniciativa semelhante, a rede de qualidade do Instituto Internacional do Arroz (IRRI), sediado nas Filipinas.
De acordo com Priscila, a oferta de produtos de qualidade, a partir da cultura do arroz, envolve o trabalho desde o campo até a transformação dos grãos pela indústria de alimentos. “A rede pode atuar em diferentes etapas de produção, porque a escolha da cultivar, o manejo da lavoura, o armazenamento e o beneficiamento, por exemplo, podem interferir na qualidade final dos produtos”, afirma.
Ainda segundo a pesquisadora, a qualidade pode ser também estudada a partir de como determinado país ou nicho de mercado consumidor valoriza o grão em sua cultura. Devem ser considerados também os tipos especiais de grãos com propriedades culinárias, sensoriais, nutricionais e funcionais peculiares, como arroz preto, vermelho, arbóreo e aromático. Complementarmente, outra possibilidade é o desenvolvimento de produtos diferenciados, sem glúten, como massas e biscoitos derivados da farinha de arroz.
“Nós temos cultivares de grãos especiais sendo lançadas, mas muito pouco exploradas em termos nutricionais e funcionais. Precisamos incentivar pesquisas que busquem novos usos, formas de preparo e possibilidades de aproveitamento industrial do cereal em farinhas e extrusados que sejam saudáveis. O arroz oferece diferentes possibilidades e estamos apenas engatinhando nesse mercado no Brasil”, considera Priscila.
Priscila avalia que, de forma geral, a rede pode estimular a disputa entre empresas pelo mercado latino-americano de arroz. Como o foco do trabalho é beneficiar o consumidor com cultivares de qualidade, as necessidades de determinada localidade podem ajudar na seleção e ditar a aptidão ou a demanda por produtos, abrindo um leque de opções para a concorrência e para o aproveitamento de nichos de mercado. “Essa diversificação é uma oportunidade para aqueles que quiserem produzir com excelência e o consumidor final só terá vantagens, com acesso à informação sobre os produtos e muitas opções para variar seu cardápio e alcançar suas metas de nutrição e saúde”, destaca.
Desenvolvimento de mercado
Um dos participantes da rede, o CEO da S21 Solutions, Alberto Takeshi, espera que a iniciativa se transforme em referência de qualidade e fonte de consulta profissional, além de orientar ações voltadas para a melhoria do produto. “Meu desejo é compartilhar minha experiência acumulada e também aprender com os especialistas do grupo”, diz. Takeshi trabalha há mais de uma década no ramo de Análise Digital Física de Arroz, aplicada ao rendimento industrial do grão. Ele possui interlocução com indústrias arrozeiras para facilitar a tarefa de padronização oficial de classificação do grão no beneficiamento.
Já Giovani Albuquerque, gerente de vendas da Corteva Agriscience, nos estados do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, considera que a rede possui grande aderência à missão da empresa. Ele diz que pretende contribuir com debates sobre agendas estratégicas da cadeia do arroz e desenvolvimento do mercado.
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