O retorno às aulas e cuidados que os pais e mães devem adotar
Dr. Julio Côrte Leal é pediatra
Estamos em agosto. Entramos na fase de avaliação da reabertura de escolas, e esse tem sido um dos grandes temas de conversas em WhatsApp entre pais e mães de crianças das mais diversas idades. Não é trivial a decisão de manter os filhos em casa, e nem de enviá-los de volta ao ambiente escolar, pois há riscos em ambas as situações. O secretário municipal de Educação de São Paulo, Bruno Caetano, em entrevista comunicou que a probabilidade de retorno às aulas no começo de setembro, é baixa, dado o cenário de crescentes casos e suspeitas de Covid-19, assim como a incerteza de como será o restante do ano letivo.
Ao reabrir as escolas, os riscos para as crianças são relativamente baixo, visto o padrão de evolução benigno da doença nesta faixa etária, mas existem riscos a serem considerados para a equipe escolar, pais / cuidadores e para a comunidade em sentido mais amplo. Manter as escolas fechadas causa perda de aprendizado e deterioração da saúde física e mental das crianças e da família, além de ampliar desigualdades, tanto na educação como em perspectivas de longo prazo.
O Ministério da Educação, em resposta aos deputados federais, informou que não consegue quantificar a adesão dos alunos ao ensino remoto. Além de buscar equalizar esse desnível entre crianças das mais diferentes origens, a reabertura das escolas também é fundamental para destravar o resto da economia, permitindo que educadores voltem plenamente às suas posições de ensino e que pais e mães consigam estruturar melhor seu trabalho. As evidências sobre o risco de infecção, com a reabertura das escolas, ainda são limitadas, porém, a retomada em outros países mostra que, até o momento, o risco não é tão alto.
Como publicado recentemente pela Economist, estudos sugerem que crianças abaixo de 18 são menos propensas a pegar a doença. Aqueles abaixo de dez anos, de acordo com dados britânicos, tem mil vezes menos chances de falecer se comparado a adultos entre 70 e 79 anos de idade. Dados também sugerem que crianças não são mais propensas a infectar outros: na Suécia profissionais que trabalham em berçários e escolas primárias - que nunca fecharam - não foram mais propensos a pegar o vírus do que outros trabalhadores. Na Alemanha, um novo estudo com 1.500 alunos e 500 professores, que retornaram à escola em maio, mostrou que apenas 0.6% tinham anticorpos contra o vírus, o que equivale a menos da metade da média nacional vista em outros estudos.
Vale destacar que houve surto da doença em uma escola de ensino médio de Israel, o qual infectou mais de 150 alunos e professores. Porém, com precauções e medidas de segurança, esse risco pode sim ser minimizado. Contudo, os riscos de perder aulas presenciais, é enorme. As crianças aprendem menos, perdem o hábito de aprender, e a qualidade de acesso à internet também aumenta o distanciamento entre crianças de diferentes classes sociais. A organização "Save the Children" estima que aproximadamente 10 milhões de crianças podem abandonar os estudos, principalmente meninas, por conta do fechamento das escolas durante a pandemia.
Estudo feito pela ONG britânica “Pregnant Then Screwed”, criada para diminuir a discriminação materna, revela como o Covid-19 afetou negativamente a carreira de diversas mães no Reino Unido. Realizada com 20 mil mães mostrou que, 81% delas precisou recorrer a ajuda de terceiros para poder trabalhar, 72% tiveram que reduzir a jornada de trabalho remunerado por causa dos cuidados com as crianças e 15% foram demitidas ou pediram demissão
O momento da retomada
Para estabelecer o cronograma de volta às aulas, líderes governamentais e as escolas precisam avaliar o risco para a saúde pública, a capacidade de adotar medidas de segurança, e a importância econômica da escola para pais e crianças. Ainda não está claro o papel de crianças na transmissão do novo coronavírus, ainda mais considerando a flexibilização da retomada econômica. Porém é fundamental entender a capacidade das escolas em criar e manter medidas para mitigar o risco de infecção, o que inclui infraestrutura, orçamento, políticas e processos, entre outros. A decisão acerca do momento é uma combinação de todos esses fatores.
Quem deve voltar?
A reabertura também não é uma decisão binária, em que todos voltam ou ninguém volta. Países como Dinamarca e Noruega priorizaram o retorno da educação infantil para que pais possam retornar ao trabalho. Como abordado acima, esse grupo também está entre os que têm menor risco de transmissão e contágio. Já Alemanha, priorizou a volta dos alunos em anos importantes de transição escolar - e crianças mais velhas - são as mais propensas a cumprir protocolos de saúde e segurança. Há que se considerar que pais também possam preferir manter seus filhos em casa, e assim algum grau de educação remota ainda será necessário.
Medidas a serem adotadas
Há uma série de iniciativas a serem realizadas pelas escolas para elevar a segurança de todos, porém como tudo o que discutimos até aqui há decisões não triviais de como proceder. Por exemplo, alternar dias letivos entre diferentes grupos de alunos pode facilitar o distanciamento social, mas dificultar a organização de pais em relação aos cuidados com as crianças.
Escolas com espaços não utilizados, e equipe suficiente, podem escalonar horários, separar as mesas com o mínimo distanciamento e organizar alunos em mais e menores grupos, porém escolas com orçamento limitado, equipe reduzida, e salas cheias possuem menos flexibilidade. São quatro dimensões distintas que devem ser consideradas ao desenhar as medidas de saúde e segurança a serem adotadas:
Infraestrutura física: podem facilitar a aplicação de distanciamento social e protocolos de higiene com ações de baixo custo como sinalização no chão, entradas e saídas diferentes por grupos de aluno, e instalação de estações de álcool gel. Porém atualizar o sistema de ventilação, fazer com que seja possível abrir portas de banheiro sem necessidade de toque, e outras medidas necessitam de um orçamento maior.
Horários e equipe: o escalonamento reduz a quantidade de pessoas ocupando simultaneamente o mesmo espaço, porém também reduz o tempo de ensino.
Transporte e alimentação: são momentos em que há maior proximidade física, e são necessários ajustes para diminuir exposição, sendo particularmente desafiador quando se trata de crianças pequenas.
Políticas de saúde e comportamento: há medidas mais claras, como adotar medição de temperatura na entrada das escolas e uso de máscaras, porém também é preciso definir processos para quando, por exemplo, algum membro da escola tiver caso confirmado da doença.
Porém vale reforçar que os pais também possuem o seu papel em educar e conscientizar os filhos sobre como agir. Algumas sugestões do que podem fazer:
Ensinar e dar o exemplo de boas práticas de higiene para os seus filhos, como: lembrar as crianças de lavar as mãos com sabonete frequentemente, por pelo menos 20 segundos e em sete etapas: palmas das mãos, dorso das mãos, entre os dedos e atrás dos dedos, polegares, embaixo das unhas e punhos, avisar para evitar tocar na face e, caso precise, para higienizar as mãos antes e depois, e ensinar seu filho a espirrar usando o cotovelo ou paninho, e descartá-lo na sequência.
Monitorar a saúde de seus filhos. Caso a criança tenha febre ou esteja doente, avisar o professor imediatamente, não mandá-lo para a escola, e procurar orientação médica.
Encorajar a criança a fazer perguntas e falar sobre seus sentimentos com os adultos. É importante ser paciente e mostrar compreensão, além de comunicar, trazer o lúdico para crianças menores e construir confiança.
Manter-se atualizado sobre a pandemia. Previna estigmatizar a doença e lembre a criança de ser atenciosa com outras crianças.
Estar próximo da escola e ativamente medidas de segurança propostas.
Auxiliar a criança a manter um estilo saudável de vida, com rotina, alimentação balanceada e exercícios físicos.
Retomar o ensino presencial não será tarefa fácil, mas os benefícios são enormes, com alunos aprendendo, pais e mães conseguindo trabalhar, e o vírus controlado.
Dr. Julio Côrte Leal é diretor médico da Theia, plataforma que dá suporte de saúde física e emocional a pais, mães e seus filhos. É formado em Pediatria pela Universidade de São Paulo, especialista em Alergia e Imunologia no Instituto da Criança do Hospital HC-FMUSP.
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